Bruna Moraes 06/01/2024
Se a Casa 8 Falasse - Vitor Martins
A Casa 8 localizada na Rua Girassol, em Lagoa Pequena/SP, já teve muitos moradores, mas três em especial merecem a nossa atenção, Ana, Greg e Beto, os três moraram na casa 8 em décadas diferentes com suas respectivas famílias. Ana no início do novo milénio, os anos 2000, com seu pai Celso, viveram muitos desafios, segredos e dias bons.
Enquanto Greg, apesar de não morar lá, passou uma temporada com a tia Catarina, nos anos de 2010, ajudando na sua locadora de garagem, apesar de ninguém mais precisar alugar filme. Sair da capital paulista para o interior, foi assustador para Greg no início, mas não imaginava o quanto Lagoa Pequena poderia ser tão acolhedora.
Já Beto, vivenciou o período dos anos de 2020, no início da pandemia do Covid-19, onde as pessoas precisaram se reinventar e arrumar algo para fazer no tédio da quarentena. Com ele não foi diferente, acostumado com a vida agitada se viu preso em casa com a sua mãe, psicóloga que vê o lado positivo de tudo, e a irmã perfeita. Mas era claro que ele estava errado sobre sua percepção das coisas, inclusive sobre si mesmo.
Em meio a esse caos das gerações, as paredes da Casa 8 tinham sim ouvidos, que possibilitaram conhecer seus moradores e contar suas histórias, além de sentir suas emoções, dores e alegrias.
Obviamente a capa cumpre o seu papel de chamar bastante atenção, atraindo o leitor para uma boa fofoca de vizinhança. Uma leitura leve e empolgante, que faz o leitor ficar preso e curioso do início ao fim. Sob a perspectiva de uma casa, conhecemos a vida de Ana, Greg e Beto, que apesar de estarem em décadas diferentes, vivem os mesmo conflitos amoroso, os dramas adolescentes e as instabilidades emocionais, além dos enredos se relacionarem entre si.
Ana é uma adolescente de 16 anos, que está apaixonada por uma outra menina, a Letícia, com a qual namora. Seu pai vive tão focado nos computadores e no trabalho, que nem percebe as questões amorosa da filha, mas agora a vida dos dois está prestes a mudar radicalmente, a nova proposta de emprego do pai no Rio de Janeiro irá leva-los a se despedirem de Lagoa Pequena e da Letícia. No entanto, essa mudança repentina foi fundamental para reaproximar pai e filha, principalmente, para conversarem sobre a mãe, que não sobreviveu ao parto, e a sexualidade de Ana. Quem não queria que todos os pais fossem tão compreensivos quanto Celso? Na prática sabemos que não é assim, mas amamos uma história LGBT com amor e compreensão.
Já Greg vive uma realidade completamente diferente, seus pais estão vivenciando um divórcio e decidem enviar o filho para Lagoa Pequena, para ficar um tempo com a tia Catarina. No entanto, essa proximidade muda completamente a vida dos dois, Catarina acostumada a vida solitária junto de seu cachorro, gostou da agitação que Greg trouxe, sua paixonite por Tiago, a reforma na locadora. E Greg se sentiu em casa pela primeira vez, onde era tratado como ele mesmo e recebia as demonstrações diferentes de afeto da tia, que foram fundamentais. Confesso que esses dois juntos me tiraram boas risadas, uma história leve, mas cheia de significado.
E, por fim, Beto, que não estava vivendo o melhor momento do mundo, todos sabemos como foram os dias na pandemia, teve que se reinventar para explorar seu lado fotógrafo dentro de quatro paredes. Além de ter se aproximado mais da irmã e da mãe, os momentos em família até que não foram tão ruins. Sem perspectiva de fim, fazer planos eram algo incerto e o deixava sem esperança, na realidade todos nos sentimos assim.
Histórias reais, de vidas reais, é quase impossível não se identificar com um dos personagens, quiçá com todos. A maneira que o autor aborda a sexualidade foi tão natural, que até deu para sonhar que vivemos em um país inclusivo, onde essas relações são completamente normais (que de fato são mesmo). Um livro excelente para começar o ano, que nos enche de expectativa sobre o agora e o amanhã.
“Precisava lembrar de como era me sentir em casa. Tenho saudades de morar aqui, mas me dei conta de que casa não é só um lugar. Nossa casa é a gente”.