Caroline Gurgel 16/10/2013Um tanto assombroso, no bom sentido...Para que meu raciocínio seja entendido devo dizer que o primeiro livro que li de Zafón foi Marina, seu quarto livro, e logo passei para A Sombra do Vento, seu quinto livro e obra-prima. Zafón considera seus quatro primeiros livros como sendo literatura juvenil, embora o indique para todas as idades e peça que não os comparemos com seus romances adultos. De fato, apesar de Marina ter me encantado e ter ganho um pedacinho do meu coração, nada se compara a grandiosidade e densidade de A Sombra do Vento, com seus inúmeros personagens e épocas que se entrelaçam, seus assassinatos e as relações de ódio, ressentimento, arrependimento, amor, incesto e traição. Por mais que queiramos, não há como não comparar ou criar grandes expectativas.
Já que queria ler toda a sua obra, decidi (re)começar pelo seu primeiro livro, O príncipe da Névoa, e seguir a ordem em que foram escritos. Portanto, cá estou para falar do segundo romance, O Palácio da Meia-Noite, que assim como o primeiro, ainda não tem a linguagem poética e metafórica que tanto me fez salivar e me encheu os olhos. Se isso é o que espera, irá se decepcionar, certamente, mas se deseja apenas uma estória cheia de mistério e fantasia - muita fantasia, diga-se de passagem - escrita por alguém que, de tanta despretensão, parecia não ter ideia aonde chegaria, poderá gostar e desfrutar de alguns momentos um tanto sombrios e macabros, no melhor sentido.
O Palácio da Meia-Noite se passa em Calcutá no ano de 1932, dezesseis anos após o nascimento dos gêmeos Ben e Sheere, que tiveram suas vidas separadas para que o temível Lahawaj não os encontrasse. Sheere fica com sua avó e Ben cresce em um orfanato. Com outros seis órfãos, Ben cria uma sociedade na qual prometem proteger uns aos outros acima de tudo. Quando Lahawaj reaparece, esses jovens não imaginam o rumo que suas vidas irão tomar e é aí que começa uma sequência de mistérios tenebrosos e mais que fantasiosos.
O começo do livro prometia muito mais do que ele realmente se mostrou. O foco nos dramas familiares, estórias do passado e os relacionamentos dos personagens foram bem interessantes e me prenderam bastante. Da metade para o fim é que a fantasia extrapolou todos os limites da realidade. Explico. Nos outros livros, nunca se sabia ao certo o que era realidade e o que era fantasia, não se sabia se os fatos narrados eram frutos da imaginação do personagem, se aquilo tinha acontecido ou não e poderíamos encontrar um caminho para explicar tal fantasia. Aqui, não. Não há como. É fantasia pura, sem outra explicação.
Não posso deixar de citar as descrições do autor, sempre minuciosas, bem colocadas e meticulosas - sem se tornar prolixo - que facilmente nos transportam para o cenário descrito. O Palácio da Meia-Noite também tem um pouco de suas maestrais idas e vindas no tempo, uma das principais características de seus enredos. Não tem como não se encantar por esse maravilhoso contador de estórias e a peculiar magia que envolve cada uma de suas palavras.
Dos quatro livros que li, esse foi o que menos me cativou - apesar de ser notável a evolução textual entre ele e seu primeiro livro - mas ainda assim recomendo para os que queiram, como eu, degustar toda a sua obra, pedacinho por pedacinho, até que outro A Sombra do Vento chegue até nós e possamos, novamente, encher a boca de água.