spoiler visualizarLois 17/02/2020
É uma leitura rápida, mas poderia dizer que é fácil? Acho que não.
É difícil escrever sobre esse livro porque ele possui tanta sensibilidade que tenho receio das minhas palavras não fazerem jus ao que ele realmente nos faz sentir.
Apesar de lermos sobre um garoto fictício aqui, dói saber que essa é realidade de muitas crianças. Dói saber que muitos pais estão passando pelo mesmo que os pais do Sam estão. Dói ter consciência de qual será o final.
Temos uma sensação de injustiça durante toda a leitura, um aperto no peito que nos diz que não é justo que ninguém passe por aquilo, quanto mais uma criança, que ainda não viveu nada. Alguém que ainda teria uma vida inteira pra explorar o mundo.
Mas como é saber, com toda certeza, que você irá morrer? A pressão gigantesca de tentar aproveitar tudo ao máximo tendo consciência que os dias estão contados deve ser insuportável. Muitas vezes nas nossas vidas não conseguimos alcançar pequenas coisas por conta da pressão, imagina isso?
E será que ainda existe aquele fio de esperança que a gente costuma se agarrar mesmo quando sabemos que algo não vai dar certo?
Vemos essa pontada de esperança no capítulo que o Sam cria a história em que ele finalmente recebe a cura e que ninguém nunca mais morreria por leucemia. É aí que vemos que mesmo que ele aja como se estive tudo bem, no fundo, aquela esperança, aquela vontade de viver, que todos nós temos, ainda está lá. Mas infelizmente... "Essa história eu inventei."
E talvez essa seja a chave da vida e do que é ser humano: nunca perder as esperanças, mesmo nos momentos mais difíceis, mesmo nas questões mais impossíveis. É o que nos mantém respirando e enfrentando um novo dia.
"A Sarah sempre deixa as janelas abertas! E nada acontece com os filhos dela!"
O peso que os pais carregam de, apesar de saber que nada é sua culpa, ainda assim se culpar, é tão real. Saber que não há nada que você possa fazer, mesmo sentindo que a responsabilidade de cuidar dos seus filhos é sua, é algo muito dolorido. Quando a mãe dele vai abraçá-lo, por exemplo, e não consegue, porque ele sente dor, é revoltante. É revoltante pela injustiça da situação que é uma mãe não poder ao menos pegar o filho nos braços e apertá-lo contra si. É um sofrimento, para quem está dentro e pra quem está fora, inimaginável.
Cada um tem um jeito próprio de lidar com as perdas e um jeito particular de sofrer. A gente consegue ver isso através do pai dele e da forma que ele age. Ele tenta com todas as forças manter as coisas no lugar, agir como se nada estivesse acontecendo, pra evitar lidar com uma situação que é inevitável. E por isso acaba perdendo alguns momentos preciosos, como quando eles vão andar de trenó e ele se recusa a ir. Mas mesmo assim, não há como julgar a forma como cada um lida com situações difíceis, pois cada ser humano é único.
"Morrer é a coisa mais boba de todas. Ninguém lhe conta nada. Você faz perguntas e eles tossem e mudam de assunto."
Apesar de ser algo irremediável, lidar com a morte raramente será algo fácil pra maioria das pessoas.
"Será que o mundo ainda vai continuar aqui quando eu não estiver mais nele?"
"Para onde você vai quando morre?"
Questões sobre a morte são aquelas questões que jogamos pra um cantinho escuro da mente. Pra nunca precisarmos realmente pensar sobre, afinal a morte está tão distante, não é mesmo?
"Por que Deus faz as crianças ficarem doentes?"
A discussão dos dois sobre Deus é muito pertinente porque eles exploram mais de um caminho e mais de uma resposta, apesar das suas crenças pessoais. Porque, apesar das nossas crenças individuais, a certeza de que é muito injusto que algo assim aconteça às crianças, é certa.
"Mas ela vai à igreja, não vai? E isso não é se meter com coisas que não podemos compreender?"
Esses pequenos cutucões ao redor da crença religiosa faz toda a diferença no livro, já que estamos lidando com a morte, que é, assim como os seres superiores presentes nas crenças, desconhecido.
"Não tem sentido ter desejos se a gente pelo menos não tentar realizá-los."
O Felix tentando fazer a lista do Sam se completar é tão maravilhoso. Porque ele mostra que não precisa ser perfeito, existem muitas formas de fazer uma mesma coisa, o importante é que ela seja feita. Como a discoteca no guarda-roupa, por exemplo.
"Não era mesmo o que eu queria quando escrevi o desejo. Estava tudo bem. Era a sensação que eu queria, mais do que qualquer outra coisa. E eu senti."
Fora que o humor áspero do Felix é incrível, dá um contraste necessário ao Sam.
A cena final do Felix foi de apertar o coração, ele abrir os olhos e sorrir para o Sam, foi talvez a melhor forma que ele poderia ter encontrado de ir embora com certa paz. Ao lado de uma pessoa que provavelmente a entenderia melhor do que ninguém. Outra coisa que vemos claramente é como os velórios são para os vivos e não para os mortos. No funeral do Felix as pessoas dizem coisas infiéis sobre o que ele era ou em que acreditava e isso só nos confirma que essa despedida é apenas para o conformo dos que continuam aqui. É a imagem que eles querem ter do falecido, mesmo que seja fantasiosa, desde que se torne mais fácil aceitar a sua partida.
A lista número cinco: como viver eternamente, é de uma delicadeza e humor destruidor. Afinal, tenho certeza, que todos nós, alguma vez na vida já questionamos como seria viver pra sempre e até já desejamos isso. Mas nem sempre viver eternamente significa necessariamente estar vivo, presente, em carne, eternamente. Há outras formas de se fazer presente, mesmo depois de já ter ido embora fisicamente. Há como fazer a diferença e deixar sua marca aqui, para as próximas gerações. E na verdade, isso é uma das coisas que mais me atormentam: a necessidade de não morrer em vão.
"Senti-me estranho e tonto. O mundo parecia diferente - do jeito que ele parece às vezes, quando você percebe que é aquela pessoa observando o mundo e de repente compreende como o mundo é estranho."
Não havia forma melhor de fechar a história além de como aconteceu: sua morte sendo preenchida por formulários, como Felix havia sugerido e ele deixado por escrito, outra lista, das coisas que ele gostaria que acontecessem após sua morte.
"Podem ficar tristes, mas não é permitido ficarem tristes demais. Se ficarem tristes toda vez que pensarem em mim, então como vão poder se lembrar de mim?"
Por fim, é sempre clichê falar que devemos acordar para a vida e vivê-la ao máximo, todos os dias. Mas não importa, é verdade. O ser humano tem a necessidade de ser relembrado mesmo das coisas mais óbvias. Essa história serve pra nos mostrar que não sabemos como o amanhã virá pra gente, então devemos aproveitar o nosso hoje e fazer um presente feliz. Procurar realizar nossos sonhos, nossos desejos, falar o que sentimos e não reprimir sentimentos ou vontades.
Nós, que estamos aqui, tão certos de que temos uma saúde boa e uma vida inteira pela frente, deixamos tudo para depois, sempre pensando que "ainda teremos muito tempo", mas a verdade é que a gente não sabe. Temos que parar de pensar que teremos sempre o amanhã.
Realize-se agora, tente agora, diga agora.
Seja feliz agora.
Não planeje sua felicidade pro futuro.
Nota: 4.0