Mari 21/12/2020
Que peça incrível!
Não tenho muita oportunidade de ver peças de teatro, porque no Rio é assim, cultura é só pra quem mora na Zona Sul, então teria que pegar no mínimo 2 ônibus lotados e andar um bocado para conseguir chegar num teatro e na volta seria a mesma coisa. E, por isso, não acompanho muito a arte do Teatro, tanto que só fui ouvir falar nessa peça de Nelson Rodrigues nesse ano quando li o livro "Onde Andará Dulce Veiga?" de Caio Fernando de Abreu, que me deixou curiosa. Já tinha lido "Vestido de Noiva" do Nelson Rodrigues, mas não lembro muita coisa (deveria reler), então decidi ler "O Beijo no Asfalto". E minha ignorância em relação ao Teatro ficou muito surpresa, quando descobri que essa peça é muito famosa.
Para quem também não sabe nada de teatro, "O Beijo no Asfalto" é sobre um rapaz casado, chamado Arandir, que ao presenciar o atropelamento de um outro rapaz, beija-o na boca poucos instantes antes do mesmo morrer. Esse acontecimento é presenciado por dezenas de pessoas, inclusive o sogro de Arandir, Aprígio. A cena também é vista pelo jornalista sensacionalista, Amado, uma ironia de Nelson Rodrigues, já que o personagem é absolutamente detestável. Depois de ver o beijo, Amado se une ao delegado Cunha na investigação do caso. Só que eles não investigam o atropelamento, se o motorista estava bêbado ou não, eles nem se importam com isso. A investigação mesmo é a orientação sexual de Arandir, afinal por que um homem casado beijaria um outro homem no meio da rua? Essa pergunta seria plausível se fosse feita por pessoas fofoqueiras, mas não por um jornalista e um delegado que deveriam investigar um crime, no caso o atropelamento do rapaz, mas para eles o crime é Arandir ter beijado o rapaz. Assim, os dois começam a fazer um jogo de manipulação e de ameaça com várias pessoas envolvidas, para chegar aos seus objetivos: vender jornais e prender um assassino. Com isso, eles provocam a desgraça na vida de várias pessoas, não só de Arandir, mas de sua esposa, seu sogro, sua cunhada e da viúva do rapaz que foi atropelado.
Quando eu vi as cenas de beijo, pensei que as pessoas devem ter ficado chocadas ao ver dois homens se beijando nos anos 60, porém elas devem ter ficado chocadas mesmo com o que Amado e Cunha fazem para convencer a todos de que Arandir tinha um relacionamento com o rapaz e o assassinou, cometendo um crime passional e depois, beijou-o.
A peça é realmente muito boa (que plot-twist foi aquele??) e fala de assuntos muito atuais, apesar de ser dos anos 60, como violência policial, fake news, sensacionalismo e homossexualidade. Fiquei com vontade de ver a peça encenada, mas isso deve demorar bastante ainda, então vou correr atrás dos filmes.