Lucas.Wijk 17/02/2015
Um suspense lento e fraco
“1222” foi um livro que me chamou a atenção graças ao grande apelo publicitário que foi feito em cima dele: anúncios constantes na rádio, dezenas de exemplares empilhados nas livrarias, e a chamada na capa que comparava Anne Holt com Agatha Christie e Stieg Larson! Apesar de ter uma lista de livros para ler, resolvi abrir uma brecha e dar uma chance a essa autora norueguesa.
O livro se apresenta como um suspense policial, onde centenas de pessoas ficam presas dentro de um hotel na Noruega, graças a uma tempestade de neve que causou o descarrilamento do trem no qual se encontravam. Resgatadas pela Cruz Vermelha e por alguns funcionários do hotel, todos os passageiros ficam enclausurados nesse ambiente claustrofóbico cercado de neve onde, para piorar, acontece um assassinato, cabendo à Hanne Wilhelmsen, uma ex-policial paraplégica, tentar solucionar o crime.
A ambientação do romance tinha de tudo para prender a atenção do leitor, mas Anne Holt demonstra, em poucas páginas, sua falta de habilidade narrativa, tornando o livro enfadonho e sem graça. Suspense é o que menos existe nesse livro. Ao contrário de Agatha Christie, em “O Caso dos Dez Negrinhos” e “Assassinato no Expresso do Oriente”, que possuem características comuns de suspense em um ambiente claustrofóbico, Anne Holt não teve a capacidade de transformar um hotel isolado pela neve em um local propício para crime e mistério.
As personagens continuam as mesmas, desde o início do livro, até seu desfecho. A autora tenta narrar comportamentos diferentes em cada uma delas, mas, na essência, é evidente que nada mudou, a não ser com Hanne Wilhelmsen, que se torna um pouco menos chata e mais sociável no decorrer do livro. Fora isso, todos os outros permanecem quase tranquilamente no hotel, onde não falta água nem comida, como se fossem hóspedes comuns. O maior aperto que passam, com exceção do assassinato ocorrido (que ninguém dá realmente importância), é com a falta de banho, que sequer faz sentido, tendo em vista que existiam quartos e banheiros aquecidos de sobra para que todos se lavassem.
Essa falta de suspense, os pequenos deslizes factuais e a terrível falta de habilidade na narração em primeira pessoa fazem com que o livro se torne extremamente lento e cansativo. A narração na visão de Hanne Wilhelmsen nos cansa com seus constantes devaneios em momentos inoportunos, e serve apenas para nos mostrar sua ineficácia como detetive.
Sherlock Holmes, Hercule Poirot, Nero Wolf e Auguste Dupin são famosos detetives da literatura que possuem duas características em comum: são extremamente sistemáticos e são dotados de um raciocínio rápido e afiado. Apesar serem inconvenientes, nenhum deles chega a ser realmente chato, pelo contrário, são capazes de cativar o leitor com facilidade. Hanne Wilhelmsen, por outro lado, se apresenta como uma personagem aborrecida e chata, insuportável não somente para os outros personagens, mas também para o próprio leitor. Além disso, falta-lhe a capacidade de raciocínio dos outros detetives: se não fossem seus devaneios e sua antipatia, o crime poderia ser solucionado logo no primeiro dia.
Em relação ao mistério, Anne Holt não se esforçou para criar nada de inovador. Pelo contrário, o livro apela para o mais básico dos suspenses, com uma história fraca e mal planejada. Além de ficar evidente, antes das últimas 100 páginas, quem é o assassino, somos decepcionados pela sua falta de profundidade e pela falta de surpresas na execução e solução do crime.
Outro mistério ainda ronda o livro, que parecia ser mais interessante do que o crime em si mesmo. Ao final, a autora consegue novamente nos decepcionar, apresentando uma descrição vaga e inconclusiva como resposta. A única solução plausível para esse mistério beira o absurdo, numa falha tentativa da autora em nos surpreender. Diante desses elementos, fiquei frustrado e infeliz com a comparação falaciosa de Anne Holt com Agatha Christie, autora que quase sempre consegue nos surpreende nos desfechos de seus livros.
Apesar de todas suas falhas, “1222” ainda serve para entreter, desde que seja uma leitura despretensiosa. Anne Holt ainda precisa de muita prática e criatividade para se aproximar de Agatha Christie e se tornar uma grande escritora de suspense e mistério, mas não é de todo ruim.
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