gleicepcouto 11/06/2014A inglesa Jojo Moyes é uma das poucas autoras que me faz querer ler seus livros sem nem ao menos saber do que se trata. Então, quando a Intrínseca anunciou que iria publicar A Garota Que Você Deixou Para Trás (já lançou A Última Carta de Amor e Como Eu Era Antes de Você), lá fui eu separar a minha caixinha de lenços com o livro em mãos.
Peguei a caixinha à toa, não teve nem uma ameaça de necessidade dos lenços. Não era o que eu esperava.
Moyes continua com a sua narrativa delicada, com um tom de sensibilidade tremendo. É impressionante como qualquer história em suas mãos é capaz de se tornar natural e singela. Talvez parte de seu sucesso resida aí: em tentar mostrar como o amor, apesar de complexo, pode ser simples se deixarmos que ele fale por ações e não apenas palavras.
"- É uma solidão, a guerra, não?
Dei um gole no conhaque.
- O senhor tem os seus homens. Eu tenho a minha família. Nenhum de nós está exatamente sozinho.
- Mas não é a mesma coisa, é?
- Vamos todos tocando a vida da melhor forma possível.
- Vamos? Não sei se alguém pode descrever isso como "a melhor forma".
O conhaque me deixara fraca.
- É o senhor que está sentado na minha cozinha, Herr Kommandant. Suponho, respeitosamente, que só um de nós tem escolha nessa questão.
Sua expressão se anuviou. Ele não estava acostumado a ser desafiado. (...)
- Acha mesmo que algum de nós tem escolha? - disse ele baixinho. - Acha mesmo que é assim que algum de nós gostaria de viver? Cercado de desolação? Os responsáveis por ela? Se assistisse ao que vemos no front, a senhora se consideraria... - Ele deixou a frase no ar, balançou a cabeça. - Desculpe-me, Madame. É a época do ano. Basta isso para deixar um homem sentimental. E todos sabemos que não existe nada pior que um soldado sentimental."
O livro é dividido em duas partes. A primeira narra os acontecimentos da Primeira Guerra Mundial e a segunda, o tempo presente. Ambas carregam o drama característico de Jojo, mas ela se supera mesmo na primeira parte, quando os detalhes para fazer um panorama do período são muito bem contextualizados.
Na primeira parte, Moyes imputa desespero, amor, ódio, violência, amizade - tudo ao mesmo tempo. O resultado é uma história forte, mas com sutis toques de fragilidade e, acima de tudo, esperança. Sophie se revela uma personagem determinada, guiada pelo amor ao marido; enquanto que Herr Kommandant, um homem que cumpre os seus deveres de sua posição, mas que deixa transparecer um lado humano. Ele, de longe, é a melhor personagem do livro. É ambíguo, e aparenta viver uma constante luta interna, entre quem realmente é e quem tem que ser.
Já na segunda parte, apesar de termos uma personagem também determinada (Liv Halston) nos submetemos a uma história que vive na sombra da primeira. Mesmo com enredo e personagens próprios, é, claramente, uma parte secundária - o que é um tanto desconcertante, já que ocupa dois terços do livro. Não sei se me fiz entender, mas o que quero dizer é: a história funciona como anexa à primeira, mas, sozinha, não tem tanta relevância. Talvez por ter personagens perdidas na trama (a Mo, que entra na - e some da - vida de Liv do além, por exemplo) e uma sucessão de coincidências um pouco Hollywoodianas (o modo como ela conhece Paul e como tudo se interliga posteriormente). Quer dizer, é bem escrita, mas é muito "certinho".
O modo, porém, como a autora conduziu a briga judicial pela posse do quadro, retomando a história do passado dentro do presente e unindo assim as duas histórias de amor, deu um gás para a segunda parte e foi o que me levou a agarrar o livro e só soltá-lo quando li as últimas páginas... Onde, aliás, percebi que não tinha chorado, minha caixinha de lenços continuava intacta. Dei-me conta de que tudo estava tão cor de rosa, que parecia estar lendo um chick-lit. Nada contra! É que, definitivamente, não é o que espero da autora.
Mesmo com esses altos e baixos, A Garota Que Você Deixou Para Trás é muito bom. Ei, estamos falando do padrão Jojo Moyes, gente. Até o mais ou menos dela é melhor que a maioria dos enlatados que lemos por aí - o que significa que o muito bom é ainda melhor. Leitura recomendada, mas aviso que pode deixar o lenço na gaveta.
Jojo Moyes tem 11 livros publicados e, antes de se dedicar à escrita, trabalhou por nove anos no periódico The Independent. Tive a honra de entrevistá-la em 2012.
site:
http://murmuriospessoais.com/resenha-a-garota-que-voce-deixou-para-tras-jojo-moyes-intrinseca/