spoiler visualizarVictor.Hugo 11/03/2021
Não há muito o que falar que já não tenha sido dito. Ao menos, eu não tenho, por ora, já que Medeia é uma dessas obras que sempre fazem falar. Mais singela, menos épica do que eu esperava e, ainda assim, repleta de heroísmo e grandiosidade ímpares. É incrível que possamos cair empáticos à vista de uma mulher que mata seus filhos; sim, ela apresenta conflitos para fazê-lo mas vence aquilo que podia impedir a realização do crime. Em sua conduta, já não sabemos o que é instinto e o que é razão, o que é costume irrefletido e o que é gesto pré-concebido. Altiva, nobre, Medeia conserva sempre a responsabilidade pelo que faz, não se exime da consciência de seu crime e tampouco o justifica pelo que sofrera ; tudo o que faz é pesar ambos e tomar um partido: seria-lhe impossível viver, descendente solar e feiticeira que é, humilhada e rebaixada. Sua maternidade não superava seu amor-próprio, faz o que faz pela vaidade de se manter superior, tanto no gesto como no intelecto; não se pode dizer que não sabia que não seria punida pelos deuses ou que isso lhe importasse ? quando muito ?, era superior à humanidade que lhe relegava o desdém por uma mulher aviltada e abandonada (não era isso já o bastante para satisfazer sua sede de revanche?). Essa inesquecível protagonista não é, a meus olhos e como muitos dizem, uma força representativa da barbárie; é um traço vivaz da sociedade (pouco coberto, é verdade, das sutilezas e finezas com que o dissimularíamos): a feiticeira floresce em sua perspicaz individualidade, trama ao delírio e sem se esquecer nem do pós-ato, nem do papel que incubiria aos demais integrantes da ação; Medeia age em sociedade para fazer, por fim, vencer seu eu mais profundo.