Queria Estar Lendo 14/07/2014
Resenha: A cidade do Sol
Talvez vocês possam ficar entediados por eu trazer uma resenha de um livro que há muito já passou seu burburinho, mas a verdade é que A Cidade do Sol vai figurar para sempre entre os meus livros mais queridos e essa resenha tem por intuito - além de possivelmente despertar a curiosidade em quem ainda não o leu ou não conhece - registrar uma homenagem a um livro que tanto me fez sentir, identificar e almejar entender e manejar as palavras como fez o senhor Hosseine.
Confesso que sou o tipo de fã que mal teria coragem de pedir uma foto com seu ídolo se, por um acaso da vida, o encontrasse na rua. Mas se fosse Khaled, eu faria questão de agradecê-lo por ter escrito esse livro e ter me dado a oportunidade de conhecer duas das pessoas mais incríveis do mundo - Laila e Mariam serão para sempre, pessoas reais.
Ganhei o livro no meu aniversário de 17 anos e meu pai só o comprou porque eu já havia lido O Caçador de Pipas e saia por ai declarando o meu amor ao livro para quem quisesse ouvir. Eu não botei muita fé, de verdade. Não sou a maior fã da capa e o título não me agradava nem um pouco - preconceito puro, já que a capa tem tudo a ver com o livro. O título é que foi uma tradução meio mal lavada, mas dá para levar, mesmo que deixe a gente desejando desesperadamente que pudessem surtar e fazer uma edição especial com a tradução literal: Mil Sóis Esplendidos. Até porque o título sai de um poema que fala de Cabul como a cidade dos mil sóis esplendidos.
Não se podem contar as luas que brilham em seus telhados, Nem os mil sóis esplêndidos que se escondem por trás de seus muros.(Saib-e-Tabrizi)
Gosto de encarar a obra de Hosseine como 3 peças separadas, a primeira que conta a história de Mariam na juventude, a segunda que nos leva até Laila e a terceira, o ponto de virada onde as duas se encontram. Na primeira história nós conhecemos Mariam - de longe a melhor personagem do Khaled - uma garota que vive reclusa em uma vila com sua mãe, solteira. Mariam ansia pelas visitas do pai, sempre, e dedica a ele amor e carinho incondicionais, tudo aquilo que despreza a sua mãe. Ela sempre acreditou que, se pudesse morar com seu pai, sua vida seria perfeita e ela jamais conheceria a dor. Mas quando sua mãe morre e ela, finalmente, pode estar onde sempre quis estar, ela se surpreende com a rapidez com que seu pai se desfaz dela.
Toda a inocência e ingenuidade da menina de 15 anos começa a ser derrubada, junto de seus sonhos e planos. A mágoa e a dor da personagem, confesso, foram as minhas próprias. Embora essa primeira parte tenha me deixado em um estado de esperança - falsa, pois eu já sentia a verdade por detrás de tudo - ainda me fez ler tudo com a respiração presa.
Na segunda parte conhecemos Laila, uma garota de 14 anos, e seu melhor amigo Tariq. Aos meus olhos a loirinha foi sempre cheia de vida, destinada a coisas grandiosas, a um futuro brilhante. A narração nessa parte do livro me mostrou um Afeganistão esplêndido, digno de seus mil sóis, e foi o que me fez estremecer de saudades quando a decadência da guerra e do regime talibã se instaura.
Laila sempre ouviu que poderia ser o que quisesse de seu pai, um professor universitário que se orgulhava de uma filha como ela. Laila sempre sentiu que podia ser o que quisesse. Mas Laila logo aprende que a vida nos dá o que quer, e nem sempre o que pedimos. Quando a guerra chega a sua casa, ela se vê perdida e a mercê de outras pessoas e, é em Mariam, que ela encontra uma espécie de anjo da guarda.
Para quem fica horrorizado com as matérias sobre a vida das mulheres no Iraque, Afeganistão e outros países da região que sofrem com as guerras, A Cidade do Sol é um ataque emocional. O Khaled consegui descrever tão bem e tão intensamente a vida dessas duas, que eu passei 3/4 do livro chorando. Ele te deixa saborear cada palavra que usa, permite que você extraia dela o real significado e nada passa batido, nenhum sentimento é menos avassalador, nenhuma emoção é menos retalhadora.
Laila e Mariam são tão fortes e incríveis, e você não pode deixar de lembrar que é uma história baseada em fatos reais - elas não existiram, mas as situação enfrentadas são sim, reais. O que Laila teve que enfrentar e levar adiante seria algo que eu jamais conseguiria aceitar, me senti enojada e extremamente revoltada com situações vividas por ela. Como mulher, cada "golpe" que ela recebeu, foi recebido por mim também.
Já Mariam é o tipo de personagem que eu busco quando preciso de forças. Não sei dizer se foi porque A Cidade do Sol foi um dos livros que eu li quando ainda não era tão bookaholic assim, mas eu nunca tinha visto uma personagem como ela. Tão forte e determinada, e ao mesmo tempo em que ela era tão inabalável, você sabia do passado dela. Você sabe o que ela deseja lá no fundo, e apesar dos anos que se passaram - mais de 15! - ainda é possível ver que ela é só aquela garota de 15 anos que precisava desesperadamente ser amada, ser querida, não ser abandonada. Ela só precisava de alguém que lhe permitisse amar e, em troca, amasse-a de volta.
Senti como um triunfo pessoal quando finalmente percebi que ela consegue e, devastada, aceitei o fim do livro com o pensamento de que nem tudo é mau, que a esperança pode nascer e florescer, mesmo em meio a guerra interminável. Que o que para uns é uma benção, é a maldição de outros. E, acima de tudo, que amar e ser amado não tem preço, que os extremos que enfrentamos pelo sentimento se paga no final, seja como uma palavra, um gesto ou mesmo o silêncio.
As vezes eu sinto que falo, falo e falo do livro, e acabo não falando nada na verdade. Mas a realidade é que eu não consigo falar dessas duas sem me perder, porque não existem palavras. Não sou o Hosseine, não consigo molda-las ao meu bel prazer e, se eu precisasse resumir o livro em uma palavra, Indescritível é sempre a que me tenta.
Nada menos do que seis estrelas, nada menos do que todo o meu amor.
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Esta resenha foi feita por Bianca da Silva, membro do blog 'Só mais um', e a reprodução integral ou parcial da mesma é proibida. Plágio é crime.
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