Piter 29/10/2022
"É só isso mesmo?"
Ever carrega uma cicatriz na testa desde o acidente onde se tornou órfã. Mas não apenas sua aparência foi modificada, pois ela é capaz de enxergar a aura das pessoas e tem mediunidade acentuada. Cada dia na escola é um pesadelo de vozes, até que chega Damen. Intrigante, belo, e misterioso, ele consegue silenciar tudo ao redor, além de tirar tulipas e objetos do acaso. A paixão é certa. O rapaz a fascina. E Ever sente que já o conheceu antes, talvez milhões de anos atrás.
Sim, é um romance sobrenatural clichê à lá Fallen. Diferente de seus irmãos de plot, porém, a obra tem um início atraente logo de cara. A narração simples e fluida move o leitor a avançar até as 50 primeiras páginas, coisa que não surtiu tanto efeito em Crepúsculo. Novamente, tem-se o plot da menina sem pais que é complicada e acaba se apaixonando por um ser místico. 16 Luas inverteu essa ordem (o líder das obras já citadas até aqui, a gosto pessoal). A nuance é que a escrita sucinta aliada à forma compacta entregam curiosidades do enredo no fim de cada parágrafo, construindo o cotidiano de Ever.
Comecei a leitura devido à menção de algumas bandas góticas numa cena de diálogo. De fato, esse elemento está presente e achei satisfatória sua apresentação. A Baby Bat Haven é uma personagem com um conflito razoável, e só as migalhas deixadas pela trama, através de citações de ícones góticos, além das descrições de indumentária, me foram o bastante. Aliás, referências não faltam neste livro. Elas chovem a cada capítulo, talvez até em cada folha. Apesar disso, não me pareceu um exagero, ao passo que ajudou a dar carne para a protagonista; senti que ela foi ficando palpável, realista.
O auge para mim, no entanto, foi a tradução. O tradutor entendeu de fato como pensa a língua brasileira. Adaptou dialetos, incrementou toda a linguagem típica dos autores americanos para algo com um gostinho nacional. A narração trouxe provérbios que ficariam estranhos na boca de uma garota da Califórnia, como é o caso aqui, mas funcionaram bem na minha experiência. Outro ponto importante foi o sentimento evocado. A trama aqui facilmente passaria numa Sessão da Tarde. O que reforça isso é o ambiente do oeste dos EUA, aquela paisagem litorânea de verão, Bayview, uma espécie de flerte com tantos filmes sobre colegiais. Os próprios diálogos elucidam essa conjuntura, salvo nos casos em que Ever narra.
Por outro lado, o meio da obra teve seus altos e baixos. E o final… Gente, que coisa insossa. O plot pode ser até previsível, mas ele é coerente com o resto. O problema foram algumas explicações que pareceram pouco coesas, além da péssima construção da vilã. Isso odiei. Diálogos genéricos, papel na trama idiota. A história dela pode ser curiosa, mas desenvolvida de um jeito porco. Adiante, o arco da protagonista é visível, embora tenha se fechado com aquele ar de “é isso mesmo?”. O relacionamento do casal principal tem uma espécie de dependência tóxica também, tanto de um lado, quanto de outro.
Para Sempre é parte de uma tendência estética e literária do final dos anos 2000 a qual inova em alguns ângulos, mas perde-se no desfecho. Uma leitura rápida que aquece no início, embora perde gradualmente perca calor.