Dani do Book Galaxy 27/12/2018Ficção científica pura e incrívelEm "Pedra no Céu", primeiro romance de Asimov, o autor estabelece o universo do modo como o veremos na trilogia da Fundação - em um futuro onde o Espaço não é mais um lugar desconhecido e inóspito; suas milhares de nações intergalácticas se uniram sob o mesmo Império Galáctico. Apesar de cada sociedade seguir suas próprias tradições e costumes, todas estão sob a mesma juridição do Império e devem seguir algumas regras universais.
[A Pedra no Céu]
Neste cenário, o planeta Terra se tornou um planeta marginal, abandonado, com suas terras inutilizadas por radiação. A população de bilhões de terráqueos foi reduzida a poucos milhões, e com uma tradição aterradora para o controle populacional - todos os terráqueos devem ser executados ao chegar aos 60 anos de idade.
"Para o resto da Galáxia, se é que notam nossa existência, a Terra é apenas uma pedra no céu. Para nós é o nosso lar, e o único lar que conhecemos. No entanto, não somos diferentes de vocês dos mundos siderais; somos apenas mais desafortunados. Estamos apinhados em um mundo morto, imersos entre paredes de radiação que nos prendem, cercados por uma imensa Galáxia que nos rejeita. O que podemos fazer contra o sentimento de frustração que nos consome?"
Dessa forma, os terráqueos são sinônimo de um subpovo - o preconceito que gira em torno da nossa raça é observado nas personagens que são "forasteiros" (ou seja, que não são terráqueos) de uma forma intrínseca e arraigada, da mesma forma que muitos povos hoje olham para outros e se julgam superiores.
Até mesmo Bel Arvardan, uma das personagens principais, que é arqueólogo e tem uma curiosidade acadêmica sobre os terráqueos, carrega uma bagagem de preconceito arraigado em sua mente.
[Os terráqueos e o preconceito]
"Contudo, não dava para negar que sempre teria consciência do fato de que um terráqueo é um terráqueo. Ele não podia evitar. Esse era o resultado de uma infância imersa em uma atmosfera de intolerância tão completa que era quase invisível, tão absoluta que seus axiomas eram aceitos como uma segunda natureza."
Mesmo após conhecer Pola, uma terráquea inteligente, bela e corajosa, esses preconceitos ainda moram no fundo da mente de Arvardan. E essa questão de relações intergalácticas - ou até mesmo interraciais - é aprofundada e analisada do ponto de vista das personagens, nos fazendo refletir sobre como isso acontece ainda nos dias atuais. Aliás - como isso AINDA continuará acontecendo, já que estamos lendo algo que se passa no futuro.
[Viagem no tempo e questões políticas]
Além dos aspectos sociais maravilhosamente abordados por Asimov, temos também temas clássicos de ficção científica, como viagem no tempo, vivenciada por um simpático alfaiate aposentado. Schwartz vivia tranquilamente em Chicago quando um dia simplesmente se viu nessa nova Terra inóspita, diminuída em sua importância para uma simples pedra radioativa flutuando no céu do Império Galáctico.
A viagem no tempo de Schwartz foi o que desencadeou diversos acontecimentos que levarão a uma trama envolvendo traição, costumes das sociedades e muita política. Incrível como Asimov consegue ser tão à frente de seu tempo e completamente contemporâneo, tendo escrito esse romance na década de 1950.
Algumas personagens desse centro político da trama - como o secretário do primeiro ministro, figura marcante - são estereótipos incrivelmente bem aproveitados e construídos.
Em "Pedra no Céu", temos política, questões sociais e ficção científica entrelaçadas em um enredo dinâmico que não dá para largar, culminando em um desfecho redondo e bem definido, sem pontas soltas.
Assim como a trilogia da Fundação, esse livro de Asimov é um exemplar puro do melhor da ficção científica e sempre será, em qualquer década em que o leitor resolver lê-lo.
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