Lauren / Biblioteca de Lilith 13/07/2020
Só os animais salvam
Um olhar sob as perspectivas dos animais. Contos trazendo pensamentos sobre relações amorosas entre seres humanos e bichinhos, como também questionando relações utilitárias e interesseiras onde as vezes os animais são postos como descartáveis. Em alguns momentos histórias que expõem sentimentos de empatia, em outros nos fazendo pensar sobre descaso ou até mesmo interesses de outras ordens. Os contos nos fazem pensar sobre quais as reais intenções da humanidade com os animais e porque, de fato, buscamos interagir com eles.
A proposta do livro é incrível e a edição da Darkside maravilhosa. Narrar histórias a partir da visão dos animais após sua morte e ainda fazer ligações com grandes autores da literatura é uma premissa muito instigante. Alguns contos foram muito bonitos e reflexivos, entretanto, outros foram um pouco cansativos e não funcionaram muito bem pra mim. Em vários momentos as narrativas ficaram cansativas e até um pouco confusas.
Mexilhões falando sobre filosofia e escrevendo poemas no fundo do mar foi algo bem peculiar e uma grata surpresa. Meu conto preferido. Também destaco os contos do Golfinho, Chipanzé, Papagaio e da Gata. É uma boa leitura com várias passagens interessantes pra reflexão.
“Talvez vocês devessem estar se fazendo outras perguntas. Por que as vezes tratam pessoas como humanos, as vezes como animais? E por que as vezes tratam criaturas como animais, e outras vezes como humanos?”
"Mas há milhões e milhões de mexilhões no mundo, eu sou só um", respondi.
"É mas você é um mundo por si mesmo, assim como eu", ela disse. "Somos todos pequenos mundos".
“Ele não entendera a questão: que ela não estava plena, que o casamento a forçaria a se metamorfosear de modo a ser meio pato, meio lontra, em parte sempre estranha a si mesma.”
“E se a uma pessoa não é permitido, em momento de solidão, desenvolver os muitos recursos de sua mente (intelectual, criativo, emocional, espiritual) para que possa se reerguer por si, oferecer boa companhia a si mesma, experimentará a desolação profunda de se ver alienada até do melhor de si”.
“Eles – os humanos, quero dizer – parecem acreditar que o que os separa dos outros animais é sua habilidade de amar, sofrer, sentir culpa, pensar abstratamente etecetera. Estão enganados. O que os separa é seu talento para o masoquismo. É aí que reside seu poder. Ter prazer na dor, tirar forças da privação, isso é ser humano”.
“Os humanos não são melhores. Seus laços são frágeis demais, mantidos por não mais que comida partilhada à mesa. Isso é tudo que separa os comportamentos de macacos e humanos? Refeições quentes e regulares?"
“Levei muitos dias observando Alexandra até tentar compreender a qualidade de sua solidão, e o melhor que consegui foi entender que a sua era uma solidão politica, embora eu ainda não soubesse como. (...) Mas a solidão é diferente, e a solidão feminina, quando por opção, pode ser uma felicidade”.
“Tenho consciência de que as descobertas e epifanias que uma pessoa tem ao ler nem sempre são, necessariamente, interessantes a outras, assim como os relatos de viagens pessoais na maior parte das vezes causam tedio. Tentei entender a razão disso para os humanos, e conclui que tem algo a ver com a qualidade alquímica e magica das descobertas feitas em livros”.
“Compreendi sua tentativa de mitologizar o processo poético, o animal sendo símbolo do poeta alcança seus instintos mais profundos, selvagens e predatórios. O poeta como xamã, retornando à consciência primeva animal. (...) Somos todos animais, no fim das contas.”
“Era dessa forma que lidava com o remorso de ter me trazido ao mundo, uma prole que jamais conheceria a liberdade. É pior ter liberdade e perde-la ou nunca saber o que é ser livre?”
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