Maelle 12/01/2022
Entendemos tudo errado
O texto é muito bem escrito sob uma perspectiva acadêmica. Literalmente tive a sensação de estar diante de um monografia ao lê-lo, monografia que obviamente levaria a nota máxima.
Porém, sinto que o texto não logrou completo êxito quanto a sua proposta estampada na apresentação, cujo objeto é o alcance do grande público através da didática e acessibilidade.
Não obstante, a leitura foi extremamente válida, sobretudo para afastar o meu pseudo conhecimento acerca da terminologia "Lugar de fala" e sua aplicação prática.
O termo "Lugar de Fala" tem sido absolutamente deturpado. Podemos ver no texto que a aplicação do conceito no campo fático não se restringe, como tem ocorrido, na sua utilização como ferramenta de interrupções de vozes hegemônicas. Pelo contrário.
Djamila, inclusive, fala um pouco sobre essa deturpação:
"Acredito que muitas pessoas ligadas a movimentos sociais, em discussões nas redes sociais, já devem ter ouvido a seguinte frase ?fique quieto, esse não é seu lugar de fala?, ou já devem ter lido textos criticando a teoria sem base alguma, com o único intuito de criar polêmica vazia. Não se trata aqui de diminuir a militância feita no mundo virtual, ao contrário, mas de ilustrar o quanto muitas vezes há um esvaziamento de conceitos importantes por conta dessa urgência que as redes geram".
A autora, através de uma contextualização histórica com enfoque no colonialismo, e por meio de muitas citações de autoras como Lélia Gonzalez, Bell Hooks e Linda Alcoff (que pretendo lê-las urgentemente), conseguiu expor a profundidade que o tema reflete e demanda.
Trata-se de ouvir efetivamente vozes silenciadas historicamente. Trata-se de analisar discursos diversos a partir da localização de grupos distintos. Trata-se de abrir mão da individualidade para se refletir sobre estrutura social e, sobretudo, entendermos os discursos através de vivências, sem perder de vista suas respectivas categorias de raça, gênero, classe e sexualidade.
Acredito que a citação abaixo resuma bem a ideia geral:
"O falar não se restringe ao ato de emitir palavras, mas a poder existir. Pensamos lugar de fala como refutar a historiografia tradicional e a hierarquização de saberes consequente da hierarquia social. Quando falamos de direito à existência digna, à voz, estamos falando de locus social, de como esse lugar imposto dificulta a possibilidade de transcendência. Absolutamente não tem a ver com uma visão essencialista de que somente o negro pode falar sobre racismo, por exemplo"