Mauricio186 12/08/2019
Livro ruim de uma escritora boa
Iniciar esse livro no final do ano passado (quando se tornou evidente a derrota do PT) e publicá-lo às pressas, no início desse ano, já revela a intenção polêmica do livro. Mesmo assim, eu esperava uma argumentação melhor, considerando a qualidade dos livros mais profissionais que essa autora já publicou. Para começar, o argumento fundamental - que norteia toda a obra - é que a sociedade brasileira enveredou para um velho autoritarismo de raiz, a partir das marchas populares de junho de 2013, desembocando na vitória de Bolsonaro à presidência, em 2018 (apesar desse nome nunca aparecer, a fim de se dar um ar mais "acadêmico" ao texto).
A tese é, rigorosamente, falsa, uma simplificação oportunista que os intelectuais petistas criaram e que Lilia Schwarcz aderiu por um senso de dever ideológico (apesar dela própria ser muito superior a esse tipo de panfletagem). As marchas de 2013 marcam uma reação democrática a um projeto de autoritarismo esquerdista que tentava se legitimar pelas urnas, mas com todo tipo de manipulação, corrupção, aparelhamento e arrogância que vimos em diversos exemplos no século XX e que, recentemente, assistimos na Venezuela. A vitória de Bolsonaro foi resultado de um conjunto complexo de fatores (cujo principal talvez seja simplesmente o voto útil de democratas que votariam em qualquer um para impedir a volta do PT).
Dito isso, reunir apressadamente um monte de estatísticas e velhas mazelas brasileiras para "provar" que o brasileiro "optou pelo autoritarismo" é um embuste. O governo petista não conseguiu convencer a sociedade de que estava tentando construir um projeto democrático e foi derrotado (justa ou injustamente) pelos que temem o autoritarismo, e não o contrário. Não estou de forma alguma tampando o sol com a peneira: temos uma tradição autoritária, mas não é essa tradição que explica a falência do projeto socialista no Brasil. Muito ao contrário, é a força de uma tendência contrária, abolicionista, federalista, republicana e tolerante, que luta para superar os vícios do Estado autoritário que marcou nossa formação histórica e do qual os socialistas ainda sonham em reconstruir, agora sob seu controle. A derrota de Haddad (fosse para quem fosse) representou um veto popular a uma solução autoritária para nosso velho autoritarismo.