arilopes 04/05/2024
A parte que falta encontra o grande O
Infelizmente, ainda não tenho acesso ao livro físico de Shel Silverstein e necessitava muito descobrir sobre a continuação da história. Inspirado pelas lembranças de quando as professoras liam fábulas e contos de fadas durante a infância, decidi buscar alguém para ler para mim. A nostalgia desses momentos é palpável, eles parecem pertencer a uma era longínqua, quase tão remota quanto a própria infância. Após uma breve pesquisa, encontrei um vídeo de uma comunicadora lendo o livro e, ao ouvi-la, me senti uma criança de novo, um aluno ouvindo um professor descrever um mundo mágico. Crescer traz a dura realidade de que as leituras compartilhadas são raras para adultos.
É uma situação embaraçosa não saber exatamente como descrever esse livro. Bebendo da mesma ideia inicial do outro livro ? A parte que falta ?, acreditamos que falta algo em nós. E, desesperadamente, queremos preenchê-la. Chamando a atenção de outros, se escondendo daqueles que achamos que não combinam conosco, espantando aqueles com nossa vulnerabilidade ou nossa grandeza ou subestimando nossa intensidade. Às vezes, nos decepcionamos com alguém, porém esquecemos que podemos decepcionar também. Construímos uma caixinha e nos colocamos dentro dela, um invólucro para nossa incólume capacidade de errar, acreditando, erroneamente, que somos melhores, que não tomamos atitudes impulsivas ou que não reproduziríamos determinados comportamentos. Estamos enganados. Nós podemos errar com outrem e ainda ser dignos, dispostos a aprender com esses erros.
Silverstein discute essa ideia de crescimento e, para mais, que esse crescimento não precisa ser em conjunto, por vezes, é um aprendizado individual ? afinal, tudo acontece dentro de nós! Podemos quebrar algumas pontas afiadas e mudar de formas de diversas maneiras e vezes. Para que isso aconteça, é necessário coragem para levantar e puxar o corpo condoído da queda apenas para tombar novamente. E, preventivamente, doí esse processo, por isso Nietzsche nos convida a refletir sobre isso ao questionar: "a pergunta diante de tudo e de todas as coisas: você quer isto mais uma vez e incontáveis vezes?". Dizer sim para essa pergunta é assinalar a sentença que você quer viver uma vida com inúmeros altos e baixos ? e isso não significa uma vida ruim. A vida é descobrir que estamos errados e errando o tempo inteiro quando, na verdade, queremos apenas acertar em algo. E crescer é perceber onde erramos, onde podemos errar de menos.
Em A parte que falta encontra o grande O, aprendemos que devemos ser como somos. Incompletos e em nossa metamorfose. Você pode rolar sozinho. Você pode crescer ao lado de alguém com sua individualidade e respeitando a do outro. Você pode mudar por si mesmo, não porque os outros querem ou esperam. Você pode descobrir que é autossuficiente e capaz. E que ao rolar, ao trilhar seu próprio caminho, depois de muitas derrocadas e reconstruções, você não pertence a ninguém e não precisa de um encaixe para a sua plenitude. Você pode seguir em frente, imperfeito e livre, sem se preocupar com onde deveria estar, encontrando e desencontrando outros ao longo do caminho.
"Quem é você?"
"Mas não falta parte alguma em mim. Não há lugar para você se encaixar."
"Não sabia onde estava e nem se importava."