Taci 02/04/2020
"Agora me sinto forte o bastante para contar a história do meu sequestro."
Só de imaginar passar mais de 8 anos em um cativeiro, apanhando, passando fome, sofrendo como Natascha sofreu, me causa arrepios. É até mesmo difícil de acreditar que seja uma história verídica, onde realmente uma pessoa foi submetida a esse tipo de sofrimento.
No livro, Natascha narra a sua história de maneira rápida e é de enlouquecer quando paramos para pensar que realmente ela passou 3.096 dias nas mãos do horrendo sequestrador, com sérios problemas mentais, chamado Wolfgang Priklopil.
"Até hoje é difícil lidar com o fato de que perdi minha adolescência apenas em razão do capricho e da doença mental de um homem."
Achei muito interessante a comparação que Natascha fez de sua vida com o livro Alice no País das Maravilhas. É espantoso o quanto faz sentido.
Uma das partes que mais me deixou com raiva foi quando ela conseguiu duas vezes a chance de ser liberta por policiais logo no começo do sequestro, mas eles apenas fizeram pouco caso da situação.
Eu me sinto um pouco estranha gostando de um livro verídico de sequestro. Eu realmente deveria ter gostado tanto assim? Não é meio contraditório gostar de algo que deveríamos repudiar? Acredito que é de extrema importância esses livros que trazem esse tipo de conteúdo para termos consciência que isso existe, isso acontece, pode acontecer com qualquer pessoa e vai acontecer sempre. Para não nos iludirmos e deixarmos de acreditar que só existe coisas boas. Muita merda acontece por aí e ter consciência disso é bom.
Algumas de suas citações que mais me marcaram e me fizeram aprender muito foram:
"Depois de dias, eu estava sentada com ele no cativeiro jogando xadrez chinês, trilha e ludo. As circunstâncias me pareciam irreais, como em um filme absurdo: ninguém no mundo exterior acreditaria que uma vítima de sequestro pudesse se sentar com seu sequestrador para jogar ludo."
"A certeza de ter o apoio de uma família, que faria de tudo para me libertar, diminuía lentamente, porque dia após dia ninguém vinha me socorrer."
"Como um deus, Priklopil tinha o poder sobre a luz e as trevas em meu mundo. "E Deus falou: faça-se a luz. E a luz se fez. E Deus chamou a luz de dia e a escuridão de noite." Uma lâmpada me dizia quando dormir e quando despertar."
"Ele nunca permitiu que eu recebesse indícios de que não havia sido esquecida no mundo exterior. A imagem que minha vida não tinha valor para ninguém, em especial para meus pais, era, afinal, um de seus instrumentos psicológicos para me manter manipulável e dependente."
"[...]meu caso incluía mais um fator agravante: eu não fazia ideia do motivo pelo qual estava naquela situação. Enquanto a missão de prisioneiros políticos pode justificar sua prisão, [...]eu, em compensação, era incapaz de discernir qualquer tipo de lógica em meu cativeiro. Não havia nenhuma."
"Ele incutira em mim o medo do mundo exterior, onde ninguém me amava, ninguém sentia minha falta e ninguém procurava por mim - tão profundamente que se tomara maior que meu desejo de liberdade."
"Apertei firme as folhas no bolso, como se elas pudessem provar algo: que aquilo era real, que eu era real. Mas não senti nada. Apenas um grande vazio que se sobrepunha sem dó, como uma mão fria."
"As coisas não são totalmente pretas ou brancas. E ninguém é totalmente bom ou mau. Isso também vale para o sequestrador. Essas são palavras que as pessoas não gostam de ouvir de uma vítima de sequestro. Porque os conceitos de bom e mau já estão claramente definidos, conceitos que as pessoas querem aceitar para não perder o rumo em um mundo cheio de tons de cinza."
"Nossa sociedade precisa de criminosos como Wolfgang Proklopil para dar um rosto ao mal e afastá-lo dela mesma. É preciso ver imagens desses porões para que não se vejam os muitos lares em que a violência ergue sua face burguesa e conformista. A sociedade usa as vítimas desses casos sensacionalistas, como o meu, para se despir da responsabilidade pelas muitas vítimas sem nome dos crimes praticados diariamente, vítimas que não recebem ajuda - mesmo quando pedem."
"Mas nunca me deixei sucumbir totalmente à ilusão de que tudo daria certo se eu cooperasse.Você não pode obrigar alguém a ser eternamente obediente e certamente não pode forçar ninguém a amar você."