Roberto Soares 06/10/2016Quem tem medo de Erzsébet Báthory?"Resumo: o castelo medieval; a sala de torturas; as ternas moças; as velhas e horrendas criadas; a bela alucinada rindo desde seu maldito êxtase provocado pelo sofrimento alheio."
Essas figuras estão no livro "A Condessa Sangrenta", de Alejandra Pizarnik, e é a condessa húngara Erzsébet Báthory, responsável pela morte de mais de 650 jovens mulheres. Além das mortes, TORTURAS ASSOMBROSAS! Não foi à toa que em alguns lugares, Erzsébet é conhecida como a condessa Drácula.
Basicamente, tentando fazer uma resenha sem dar spoilers, Erzsébet nunca queria envelhecer, e, para isso, encarnou em si o único ser que nunca envelhece nem morre: a Morte.
"Mas quem é a Morte? É a Dama que assola e cresta como e onde quer. Sim, e além disso é uma definição possível da condessa Báthory. Nunca ninguém não quis de tal modo envelhecer, isto é, morrer. Por isso, talvez, representasse e encarnasse a Morte. Porque, como a Morte vai morrer?"
A condessa era melancólica, o que, naquele tempo, era o equivalente a se estar possuída. Melancolia esta que ele amainava dando maior velocidade à sua vida ociosa. O que a fortalecia, o que a causava orgasmos (literalmente), era a morte. Matar e ver morrer. As jovens "selecionadas" eram atraídas e aprisionadas nos subterrâneos do castelo, e ficavam à espera do destilo doloroso personificado na condessa e suas criadas feiticeiras.
Dou apenas dois exemplos das maneiras de tortura que ele empregava:
(1) Havia a Virgem de Ferro; uma mulher de ferro em tamanho real que, quando ativada, abraçava suas vítimas até sufocá-las, e, para terminas, abria os seios e de lá saíam punhais que atravessavam o corpo da vítima. O sangue era recolhido em vasilhas e usado nos banhos da condessa.
(2) Erzsébet e seus criadas levavam a vítima para os campos do castelo, durante uma tempestade de neve. Lá, apunhalava a moça e a abandonava, ferida. Mais o pior estava por vir. A condessa voltava, despia a jovem, e jogava sobre ele um balde de água gelada. Nada dava mais prazer à ela do que ver a água no corpo da jovem se transformar em gelo, enquanto a vítima, em um último movimento desesperado, tentava se aproximar das tochas da carruagem, único calor. Mais um balde de água gelada era jogado sobre a jovem, então ela se tornava uma estátua de, o cadáver de quem outrora fora fatalmente a feliz favorita da condessa.
"Só perplexidade no excesso do horror, uma fascinação por um vestido branco que se torna vermelho, pela ideia de um absoluto dilaceramento, pela evocação de um silêncio constelado de gritos onde tudo é a imagem de uma beleza inaceitável."
Apesar de toda a barbárie, é um livro bem penetrante, além de conter ilustrações assustadoramente lindas, como a que postei. E, quem leu ou quem ler me entenderá: Erzsébet Báthory, com seus espetáculos de tortura, sua fissura pela estética e seus banhos de sangue, foi a mulher mais realizada e intensa de quem já ouvi falar.
Em um mundo onde o assassinato e a tortura é democratizada; em um mundo pós Hitler, Stalin e Ustra; em um mundo onde a biologia e a tecnologia se juntam para tentar combater o que mais assombra as pessoas: a velhice; em um mundo onde as drogas lícitas e ilícitas ganham cada vez mais devoção como a cura para a melancolia, a ansiedade e a depressão, e dão às pessoas todos os tipos prazeres orgasmáticos; enfim, no mundo de hoje, quem tem medo de Erzsébet Báthory, quando ela se mostra tão inofensiva perante as barbáries cometidas legal e moralmente no mundo moderno?