Attraverso le Pagine 15/03/2018
Sete estrelas presas no giro
Da roda do céu
Sete flores dançam no pampa
No sul do Brasil
Sete mãos de fadas destrançam
Intrincados nós
Sete cruzes
Sete rosários
Velando por nós
Sete Vidas – Adriana Mezzadri
Letícia Wierzchowski é uma escritora, nascida em Porto Alegre e que aos 25 anos já havia publicado seu primeiro romance, “O Anjo e o Resto de Nós” de 1998. Mas, talvez, você deva conhecê-la pelo seu mais famoso romance: “A Casa das Sete Mulheres”, de 2002 e que deu origem a grande minissérie de Maria Adelaide Amaral da Rede Globo, produzida no ano seguinte do lançamento do livro homônimo.
Letícia Wierzchowski, autora do livro.
E a fim de iniciar novo projeto do blog sobre livros ligados à História, escolhi este romance que é um dos meus livros favoritos. A ideia é publicar a cada 3 meses alguns livros que abordam certos assuntos históricos, seja romance histórico ou livro historiográfico mesmo. Preciso de ajuda para dar continuidade ao projeto. Então, podem dar a opinião de vocês, dicas de temas e livros e, claro, um nome para essa sessão já que não faço ideia de como chamar. Mas vamos ao artigo em si.
O romance de Letícia se passa na conhecida (ou nem tanto) Revolução Farroupilha ou ainda Guerra dos Farrapos, como ficou sendo chamada por muitos livros de História de forma pejorativa, em referência aos trapos das tropas de Bento Gonçalves.
Ilustração que representa a Revolução Farroupilha, retirada do site http://jornalsemanario.com.br/quem-foram-os-herois-da-revolucao-farroupilha/
A Revolução Farroupilha foi uma das maiores guerras que o Brasil teve, ocorrida no Período Regencial, onde não havia um imperador de fato governando o recente “país” independente. Quem governava em nome do futuro imperador (ainda criança) era um grupo de regentes. Esse é um ponto que muitos estudiosos apontam como causa das diversas revoltas que ocorreram em território nacional nesse período. E a Farroupilha foi a mais longa. Foram 10 anos de batalhas entre os anos de 1835 e 1845 no Rio Grande do Sul, sendo liderada pela classe dominante gaúcha, formada por fazendeiros de gado, que usou as camadas pobres da população como massa de apoio no processo de luta.
Como local de fronteira, o Rio Grande do Sul sempre foi palco de disputas e guerras, inclusive entre Portugal e Espanha e a proteção e os recursos necessários para a defesa daquele território era sempre pedidos aos grandes fazendeiros locais. No ano de 1821, o governo central (imperial) passou a impor a cobrança de taxas pesadas sobre os produtos rio-grandenses, como charque, erva-mate, couros. Na década posterior, o governo passou a cobrar uma taxa enorme sobre o charque gaúcho, facilitando a entrada do charque importado do Prata. “Ao mesmo tempo aumentou a taxa de importação do sal, insumo básico para a fabricação do produto. Além do mais, se as tropas que lutavam nas guerras eram gaúchas, seus comandantes vinham do centro do país. Tudo isso causou grande revolta na elite rio-grandense.”
A revolta teve inicio em 20 de setembro de 1835, tomando Porto Alegre. Bento Gonçalves, um dos líderes do movimento, se tornou o vice presidente da província. Em 1836, os farrapos perdem Porto Alegre para os caramurus (ou imperiais, as tropas do governo), mas a guerra ainda estava no início.
É nesse contexto que Letícia Wierzchowski inicia “A Casa das Sete Mulheres” e logo conhecemos a doce e romântica Manuela. Ela é a sobrinha mais nova de Bento Gonçalves, o líder da revolução e, de certa maneira, o líder da família. É através de Manuela e seu diário que o leitor conhece o ponto de vista das mulheres que vivem na Estância da Barra, intercalando com a narrativa da autora em terceira pessoa. É na noite de Ano Novo que Manuela prevê, vendo nos céus do Rio Grande, uma guerra longa e sangrenta. Assim, para proteção das mulheres (além de serem mulheres, faziam parte da família de um grande líder o que as tornava um alvo fácil se continuassem em Pelotas, na cidade), esposa, irmãs e sobrinhas de Bento partem para o interior, para a fazenda da tia e ali aguardam o desenrolar da guerra, rezando por elas e por seus homens que estão na peleja.
Enquanto os homens cuidam da guerra, as mulheres cuidam da casa e das mais novas. E no livro o leitor pode sentir a angustia que as mulheres sentiam “presas” naquela casa. Mulheres jovens (adolescentes ainda) que tiveram que largar a vida na cidade grande, os bailes, as festas, as “paqueras” para um período de espera. A obra apresenta a história de forma leve, com muitas pitadas de romance, mas não sem cansar, contando todas as batalhas, conflitos, amores e dificuldades. A autora faz seus leitores suspirarem juntos com Rosário e Manuela, a torcer por Mariana, ao mesmo tempo em que deixa uma pontada de curiosidade para saber quem foram alguns dos heróis do livro como Bento Gonçalves, Garibaldi, Anita e Manuela (que tem poucos documentos a respeito dela, infelizmente).
Como em toda guerra, há mortes e a autora aborda essas mortes de forma densa e, ao mesmo tempo, linda, poética. Aos poucos, a casa vai se esvaziando, restando apenas o silêncio e a ausência daqueles que a guerra levou: pais, irmãos, amigos, amores. E esse vazio, essa ausência é sentida pelo leitor ao longo do livro. Costumo dizer que a história de Letícia é uma grande despedida em doses homeopáticas: começa com festa e termina de forma calma e com muitas mudanças, dando a vontade de possuir um vira tempo e retornar na História para mudar todos os pontos tristes que acabamos de ler. E não só de romance é feito o livro. Há detalhes incríveis sobre episódios reais como a batalha de Moringue que leva o leitor para o século XIX, dentro da batalha.
A guerra termina 10 anos depois, em 1845, com um acordo assinado em 1° de março de 1845 em Ponche Verde (“Paz de Ponche Verde”), já sem a presença de Bento Gonçalves. Mesmo o governo não concordando com um Tratado de Paz, pois é um acordo que só é realizado entre países e o governo imperial não considerava a República Rio-Grandense que foi proclamada ainda no início da revolução. Sim, o Rio Grande do Sul já foi, tecnicamente, independente, apesar de nunca ter tido o reconhecimento por parte do império brasileiro. A revolução é tão importante para o povo gaúcho que todo ano há a Semana Farroupilha, que é um momento especial de culto às tradições gaúchas, transcendendo o próprio Movimento Tradicionalista Gaúcho, acontecendo um grande Acampamento Farroupilha que tem uma duração de quase 30 dias. Durante a Semana Farroupilha são relembrados os feitos dos Gaúchos no Decênio Heróico (1835-1845), através de palestras, espetáculos, lançamento de livros entre outras atividades. Esse ano, a Semana Farroupilha acontecerá entre os dias 14 e 23 de setembro.
A primeira imagem é da nova edição. “Um Farol no Pampa” é uma continuação de “A Casa das Sete Mulheres”, mas que se trata de outros pontos históricos do Brasil, sendo trabalhado desde 1847 até 1903 e mostra o destino de Matias, um conhecido dos leitores do primeiro livro, e aborda a Guerra do Paraguai. Recentemente soube que saiu um terceiro livro, fechando, assim uma trilogia: “Travessia” que aborda a história de Anita e Garibaldi.
(Resenha por Moony)
site: http://attraverso-le-pagine.blogspot.com.br/2018/03/resenha-livro-casa-das-sete-mulheres.html