Caíque Pereira 01/10/2013A breve vida da esperança de um livro bomAs duas experiências totalmente divergentes que obtive com a leitura de obras de Patterson concluíram-se de maneira satisfatória e prazerosa. “Bruxos e Bruxas”, a aposta da Editora Novo Conceito, nossa parceira que patrocinou esta resenha, onde James parecia se aventurar por mais um inédito campo literário – ele já escreveu obras policiais, românticas e infanto-juvenis – revelou-se uma ingrata decepção. Ingrata pelo fato de que torci, e como torci, para ser uma boa leitura. Mas o meu compromisso com a verdade crítica é maior do que minha admiração pelo autor e seus colegas de trabalho.
É como entrar em um pesadelo. Do nada, você é retirado de sua casa, preso e acusado de bruxaria. Parece século 17, mas é o governo da Nova Ordem, e está acontecendo agora! Sob a ideologia da Nova Ordem, O Único Que É O Único mantém seu poder à força, sem música, sem internet, nem livros, arte ou beleza. E ter menos de 18 anos já é motivo suficiente para que você seja suspeito de conspiração. Os irmãos Allgood estão encarcerados nesse pesadelo e, para escapar desse mundo de opressão e medo, terão que contar um com o outro e aprender a usar a magia.
A premissa é ótima, o desempenho, nem tanto. A história da peleja de Whit e Wisty é contada de determinada maneira que seus piores desafios ainda serão vistos como uma grande piada. Não gosto de comparações, mas escrevo amadoramente desde os 11 anos e naquela idade era esse o tipo de narrativa que eu usava. A escrita é imatura, eufórica, insossa, incomodando qualquer um que nela se aventure e não notar como tudo é tão bobinho. Sim, “bobinho”, pois não há expressão melhor para resumir a obra a não ser essa. A falta de um objetivo claro no enredo é evidenciada pelo bombardeio de acontecimentos que pouco leva o leitor a algum lugar, soando forçados e mostrando o quão mais falsos ainda os protagonistas podem soar.
Os capítulos sob o ponto de vista de Whit são um pouco menos deploráveis de se ler do que os de sua irmã. O dilema com a ex-namorada fora o menos irritável em seus parágrafos, pois o sumo ancorava-se no famoso irmão brincalhão que não tem noção de sua boa aparência e de como chama a atenção. Apesar disso, Wisteria – inteligentemente chamada de Wisty – é o foco do texto e dos problemas. Sendo a irmã caçula, coube a ela sofrer com linhas e mais linhas de manuseios deploráveis de personalidade, comentários e reflexões tão naturais quanto uma nota de três reais e uma vergonhosa obsessão por parte dos autores em torná-la interessante.
A agilidade da leitura é explicada pelos capítulos curtos que duram no máximo três laudas e é meu ponto órfão de predileção da leitura. O leque de personagens é extenso, mas nenhum é merecedor de nota graças à falta de aprofundamento e detalhes maiores, justificados pelo enfoco natural do primeiro livro de uma série em apresentar a realidade proposta e o(s) protagonista(s) em si. Os antagonistas e o Único Que Pode Ser o Antagonista Principal – trocadilho infeliz, não pude resistir – são tão caricatos que poderia haver passagens em que torturam crianças sobre um colchão de pregos e eu estaria rindo culpado, sentindo-me um sádico. Desde frases prontas dos vilões de desenhos animados ao grande Único cujo caráter misterioso é outra tentativa frustrada pela trama, uma história promissora vai perdendo sua magia.
A diagramação da Novo Conceito, em contrapartida, é o primor pelo qual aguardamos ao pegar o exemplar em mãos. Entretanto, o aveludado externo, a boa marcação na divisão dos capítulos entre os irmãos, a tipografia forte e os galardões ao universo praticamente nonsense criado por James e Gabrielle não compensam o livro mal administrado. A realidade tresloucada não nos permite viajar com o proposto, além das dúvidas sem resposta que surgem em paralelo à linha de pensamento e dos personagens mal trabalhados e caracterizados. A tradução tampouco ajudou, optando mais de uma por termos e colocações demasiadamente informais e do cotidiano brasileiro, desvalorizando o já prejudicado texto original.
“Bruxos e Bruxas” foi para mim uma decepção, sim. Soube que já existem fã-clubes, críticas reluzentes de tantas estrelas atribuídas, porém só me resta delas discordar e aguardar os que comigo acordam. James Patterson pode transmitir total credibilidade àquilo em que coloca seu nome, mas nesse caso; enredo, escrita e personagens estão em abstinência total desse quesito. Em meio a tanta vergonha alheia, as bruxas do século 17 já o teriam classificado como “politicamente incorreto”, sem exageros.
site:
http://livrosletrasemetas.blogspot.com.br/2013/08/resenha.bruxosebruxas.html