Natalia.Eiras 03/08/2019Simplesmente sensacional!Quando você pensa em um livro que aborde o tema da escravidão, você logo imagina um negro sendo açoitado em alguma plantação de algodão, ou coisa do tipo, certo?
Mas como viviam os escravos domésticos? E as mulheres dos escravocratas? Todas concordavam com o que seus maridos faziam nos campos com os negros?
Sarah Grimké não é uma menina comum. Apesar de ser filha de um poderoso juíz escravocrata, ela não consegue aceitar a escravidão. Em seu aniversário de 11 anos, sua mãe lhe entrega Hetty, uma mulatinha de apenas 10 anos, com uma fita lilás amarrada no pescoço, de presente, para que esta lhe sirva como dama de companhia.
Sarah, à principio, se recusa a aceitar a menina como presente, mas em uma época onde as mulheres não tinham o direito de se expressar livremente, os desejos de uma criança só poderiam ser ignorados.
É dessa forma que Hetty, ou melhor, Encrenca que é o nome verdadeiro dela, entra na vida da sinhazinha Sarah.
Uma amizade começa a surgir entre essas duas garotas distintas, e Sarah promete que fará o possível para libertar Encrenca. Mas como ela poderia fazer isso?
A única coisa que ela consegue imaginar é ensinar a escrava a ler, o que na época era um crime grave, pois um escravo que sabe ler pode se revoltar mais facilmente.
Ao longo das páginas deste livro iremos percorrer toda a história dessas duas meninas, tão diferentes na cor da pele e no status social, mas que indo contra todas as possibilidades acabaram formando uma amizade e procurando, cada uma a sua maneira, a própria liberdade.
"Meu corpo pode ser escravo, mas não minha mente. Pra você, é o contrário". Encrenca para Sarah
A história é narrada intercaladamente entre Encrenca e Sarah, com isso temos o ponto de vista de uma escrava doméstica e de uma sinhá abolicionista. Esse contra ponto é muito interessante, pois você acaba entrando na mente das duas personagens.
Quanto mais eu lia, mais eu gostava da Sarah e da forma como ela vem crescendo ao longo da história, passando de uma menininha que sofria com a gagueira, até uma verdadeira revolucionária.
Quanto a Encrenca, o que chama a atenção é a perspicácia dessa escrava, que mesmo sem uma instrução formal, conseguia se livrar de grandes encrencas (desde pequena ela faz jus ao nome que recebeu) e nunca se deixou abater pela condição que vive e pelos horrores da escravidão.
Outros personagens de muita importância fazem parte dessa história, tais como Angelina Grimké, a irmãzinha de Sarah, que assim como a irmã, tem o ideal abolicionista correndo nas veias. Porém, ela é um pouco mais audaciosa em relação a irmã mais velha. Juntas, elas irão formar uma equipe incansável em busca de seus objetivos.
Eu levei bastante tempo para ler este livro, mas não foi porque a história era chata ou monótona, mas sim porque eu não queria perder nenhum detalhe. A narrativa flui muito bem e a diagramação esta impecável.
Cheguei a ter este livro em mãos, e a capa é feita de uma material aveludado, o que confere maciez. Todas as vezes que eu peguei no livro eu tive que "acariciar" a capa. Hahahaha
Conforme você vai lendo, passa a entender o título do livro, pois é justamente o que as personagens tentam fazer ao longo da narrativa: construir e inventar asas para alçar a liberdade.
E quando eu cheguei no final, eis a minha surpresa. Nas notas da autora, eu descubro que Sarah Grimké existiu!!! E grande parte do que se passa no livro é verdade!!!
Assim que terminei eu precisei correr pro Google e pesquisar mais sobre essa mulher fascinante, e descobri que ela foi muito importante para a época. Não achei uma biografia dela em português, mas quem souber inglês pode ler aqui. Ou entrar no link da Wikipédia e mandar traduzir a página, mas esse link que compartilho é mais confiável do que a Wikipédia. rsrsrs
Se você não sabe inglês, aqui esta uma parte da nota da autora, onde ela explica quem foram Sarah e Angelina.
"Descobri que passava dirigindo pela casa não sinalizada das irmãs Grimké havia mais de uma década, sem saber que essas duas mulheres foram as primeiras agentes femininas abolicionistas e umas das primeiras entre as importantes pensadoras femininas americanas. Sarah foi a primeira mulher nos Estados Unidos a escrever um manifesto feminista abrangente, e Angelina foi a primeira mulher a falar diante de um conselho legislativo. No final da década de 1830, elas eram, possivelmente, as mais famosas, e também mais infames, mulheres das Américas..."
A autora ainda chama a atenção para o fato de ela desconhecer até então as irmãs Grimké (e nós também!), o que prova que "as conquistas das mulheres foram repetidamente apagadas da história."
Esse livro é uma aula de História, com um ponto de vista diferente do que estamos normalmente acostumados a ver e uma belíssima narrativa sobre amizade e liberdade. Vale muito à pena!
Eu tenho certeza que vocês irão se apaixonar por essas mulheres...
site:
http://www.perdidanabiblioteca.com.br/2019/06/a-invencao-das-asas.html