spoiler visualizarGustavo 04/06/2023
Praticamente um livro de contos independentes e ao mesmo tempo atravessados pela mesma linha condutora: Kublai Khan e Marco Polo e as indagações sobre os significados da vida. Calvino traz uma beleza incrível nas várias formas de contar sobre as cidades: as memórias, os desejos, os símbolos, os nomes, as trocas, os fatores ocultos, o místico dos céus... Como geógrafo, fiquei muito mexido por essa descrição diferente das cidades, muito mais próxima da experiência/vivência do que a abstração positivista de descrever só o mapa, os dados estatísticos, a localização.
Destaque para as que mais me chamaram a atenção:
- Zaíra (A memória 3), cidade que mantém sua história em sua forma;
- Zora (A memória 4), cidade que foi esquecida ao tentar preservar-se estática;
- Despina (O desejo 3), cidade que assume a forma do desejo de quem a vê;
- Maurília (A memória 5), cidade que vê a beleza de seu passado por ele ser passado e não presente;
- Fedora (O desejo 4), cidade que conserva seus futuros que não se realizaram;
- Sofrônia (Delgadas 4), cidade onde o transitório é o que consideramos fixo e vice-versa;
- Eutrópia (As trocas 4), cidade volúvel, sempre mudando para evitar o tédio; Esmeraldina (As trocas 5), cidade cujos trajetos nunca são os mesmos;
- Pirra (O nome 3), cidade que questiona as imaginações que construímos de um objeto quando sabemos apenas o nome deste sem nunca o ter visto;
- Adelma (Os mortos 2), cidade onde todos os vivos nos lembram de alguém que já partiu;
- Clarisse (O nome 4), cidade que constrói sua identidade pelas reminiscências de seu passado glorioso;
- Leônia (Contínuas 1), cidade que questiona o que são virtudes de fato;
- Perínzia (O céu 4), cidade que faz questionar a suposta ordem natural;
- Raíssa (Ocultas 2), cidade que nos lembra a existência da beleza efêmera em meio à tristeza.
"Uma descrição de Zaíra como é atualmente deveria conter todo o passado de Zaíra. Mas a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão, escritos nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras" (p.14-15)