spoiler visualizarNylly 15/07/2022
Caquinhos
Não foi fácil terminar, não foi fácil chegar aqui, e não por ser um livro ruim, muito pelo contrário, a quantidade de conteúdo, a quantidade de camadas que esse livro tem é indizível, esse é aquele tipo que não importa quantas vezes você leia você irá sofre e descobrir detalhes que antes passaram totalmente despercebidos.
Essa leitura não foi simplesmente um livro para mim, vivenciei e degustei como nenhum outro, senti na pele as injustiças, a solidão e os sentimentos de Lucy como se fossem meus. Essa foi uma história sobre solidão, e creio que não há no mundo uma pessoa que em algum momento não se sentiu só. Sei que me identifiquei em alguns momentos com Lucy.
As vivências enfrentadas por Lucy muitas vezes podem ser trazidas para a nossa época, quantas vezes deixamos de falar para não sermos julgados, para não afastarmos aqueles ao redor, ocultamos a verdade. Vejo Lucy como uma mulher sabia e a frente de seu tempo, ela trás um ensinamento que muitas vezes deveríamos aplicar, que é o de nunca discutir com alguém gratuitamente, ela deixava as pessoas com suas próprias opiniões egoistas e não as tentava afastar disso.
Apesar de tudo eu desejaria ter visto Lucy mostrar toda sua genialidade, sua capacidade de interpretar as pessoas com suas frivolidades, suas fraquezas. Gostaria de ter visto ela demonstrar para aqueles que a julgavam tão sem valor o seu potencial.
Lucy não tentou convencer ninguém sobre quem ela verdadeiramente era, não correu atrás de ninguém, sofreu sozinha. Ela começou a história assim e ela não almejava companhia, sofria em sua solidão mas preferia isso a se iludir e sofrer pela perda novamente, em ser deixada novamente.
Entretanto inevitavelmente teve que conviver com pessoas, observou e reencontrou antigos conhecidos. E como Charlotte desenvolveu cada personagem foi de uma maneira impecável, inteiramente real, cruamente e sem romantismo. John foi um personagem que ao meu ver era o perfeito oposto de Lucy, a luz para a sobra que ela era, segundo ele. Uma pessoa cruel sem perceber, só por ser quem ele era, o meu sentimentos por ele foi um misto, como Lucy disse, ele era agraciado pela vida. Abençoado, nasceu para ser feliz.
E o meu querido Paul, comecei o odiando, o seu excessivo catolicismo, seus julgamentos, machismo, até esqueci os outros defeitos, pois assim como Lucy me apaixonei por ele aos poucos, a sua sinceridade se tornou uma qualidade e sua lealdade quando voltada pra Lucy abrandou minha raiva. Apesar de tudo ele foi o único que a viu não como uma sobra, mas como uma luz, alguém que tem personalidade e tem potencial. A sua raiva e sua implicância ao meu ver era apenas uma reação por um sentimento que ele a muito tinha desistido de ter e que não desejava ter, porém sentia. Ele como Lucy sofreu e se sacrificou muito, tudo o que eu desejava para eles no final era felicidade. Mas minhas esperanças foram cruelmente trucidadas pela escritora, que no final ainda debochou de nós sonhadores e românticos com nossas esperanças. Li aqueles parágrafos umas 5 vezes e me resignei ao fato, Lucy foi destinada a ser sozinha, como ela mesma disse, alguns vieram para sofrer e ter poucos momentos de alegria para ajudar a suportar os outros.
Esse livro transformou meu coração em caquinhos com a verdade nua, com a falta de romantismo que é característica da vida real e não de uma ficção, a descrição detalhada de alguém resignada a solidão e as esperanças sendo muitas vezes quebradas. A insensibilidade e a falta de compreensão, consideração daqueles ao redor, as consequências de uma empatia não genuína, o egoísmo e as frivolidades daqueles que vivem em ignorância das dificuldade dos outros. A esperança de que essa vida é passageira, para uns um céu em terra e para outros uma verdadeira provação. A justiça de Deus que á nisso e que não nos cabe compreendermos. Questionamos sim, como Jó, mas aceitamos.
Depois dessa bagagem de sentimentos me resta juntar os caquinhos e tirar o melhor dessa obra. Nada de coisas pesadas pra mim por um tempo.