bia | @biatalendo 11/06/2023
Sob um viés psicanalítico.
Essa resenha será dividida em duas partes: uma sem spoilers e outra que falarei da trama e embasar um pouco dos aspectos psicanalíticos que vi nela.
Bloch é simplesmente um gênio. Ainda preciso ver a obra de Hitchcock, mas se ele manter parte da genialidade do autor do livro, já será excelente. O aspecto que mais me surpreendeu e me deixou maluca é o quão ele põe dicas, palavras específicas, frases super bem elaboradas para chegar no objetivo final do livro. Todas as palavras usadas tem uma finalidade, e meus parabéns à tradução da Anabela Paiva, simplesmente perfeita.
Isso, é um thriller bem escrito. Com camadas absurdamente bem construídas. O livro cria apego, vínculos com os tramas para haver identificação, empatia. Faz toda a diferença ter um olhar empático para os personagens e suas histórias. É tudo viciante. Li em uma tarde e não queria parar, largar.
A edição da Darkside é excelente também. Li na edição de 2013, não há um prefácio ou posfácio, mas se houver na nova edição, acharei crucial ler a visão de alguém de confiança da editora para comentar sobre a obra. Eu estava MALUCA por essa leitura há anos, finalmente consegui o livro emprestado e valeu a pena. Já sabia de parte das revelações por conta de uma cena específica do filme do Hitchcock, mas mesmo assim, há aspectos que são perfeitamente colocados e surpreendentes. Fenomenal.
A seguir, minhas percepções psicanalíticas sobre a obra, com spoilers.
Eu sinto que há uma confusão total do senso comum do termo psicose, uma confusão com psicopatia, é diferente, não apenas na psicanálise, mas como na ciência toda. Psicose é o estado de confusão com a realidade. O psicótico não tem noção da realidade e também não tem juízo crítico, coisa que o psicopata pode, sim, ter. Achei incrível que a alucinação do Norman ser com a mãe ainda viva, bater muito com um dos temores de um psicótico: se perder, se fragmentar. A mãe dominadora ainda é a âncora dele ao mundo, deixá-la ir, era confrontar a realidade. Os mecanismos de defesas regressivos são perfeitamente utilizados aqui; a clássica negação da realidade, dou meu chute de um pouco de identificação projetiva, a projeção (especialmente na Mary ao se admirar no espelho), ah, são muitos.
Cheguei a dar um gritinho ao lembrar que o indivíduo psicótico tem as suas frustrações de maneira extremamente precoce, vindo da relação com a mãe, e o psicótico busca se fundir com o objeto, buscando reatar aquele laço objetal, que no caso do Norman, se dá com a mãe. A criança não consegue se ver separada da mãe e com a frustração de perceber a morte da mãe ideal, Norman torna-se a mãe, se ele não consegue aquele laço com a mãe viva, ele tentará restaurar numa ilusão de processo primário.
O psicótico também não chega no Édipo, Norman sequer teria como fazer a identificação com a figura masculina, essa parte chega a ser engraçada. Claro que a relação simbiótica e incestuosa com a mãe seria inevitável já que ele não teve a figura masculina para se identificar e poder entender o que é incesto e que a mãe não será sua companheira. O mais incrível é que O PRÓPRIO NORMAN FALA DO COMPLEXO DE ÉDIPO PARA A MÃE!!!!!!!!!! Essa cena é genial.
Perguntarei em aula se é possível que um psicótico tenha seus traços perversos. Sem dúvidas o Norman é um psicótico propriamente dito. Suas alucinações e despersonalizações são constantes. Adorei o trecho em que ele diz que a mãe tomba entre uma pessoa esquizofrênica e uma pessoa neurótica, clássico da anestrutura limítrofe, tá aí um possível diagnóstico para a Mãe. Tenho certeza que tem muito mais coisa nisso tudo. Quero pesquisar mais sobre a criação desses três rostos de Norman, Mãe e Normal.
Borch ganhou meu carinho, não se faz uma obra-prima dessa sem estudo. É um prato cheio para aqueles que admiram a psicanálise.