jota 28/09/2019Siga o petróleo e o dinheiro...Z, a Cidade Perdida, de David Grann, foi uma das grandes leituras que fiz em 2016. E Assassinos da Lua das Flores, do mesmo Grann, já faz parte de minha lista final dos melhores livros lidos neste ano. Em ambos os casos o conteúdo não é ficção, mas sim pesquisas, entrevistas e reportagens efetuadas com bastante vigor sobre fatos reais, que se tornaram depois obras interessantíssimas publicadas aqui pela Companhia das Letras. Z... tinha como subtítulo A Obsessão Mortal do Coronel Fawcett em Busca do Eldorado Brasileiro e em 2016 virou um filme apenas mediano. Assassinos... trata de Petróleo, Morte e a Criação do FBI: este é o complemento do título da obra.
Ela prende a atenção do leitor desde as primeiras linhas: tem mistério, muitos crimes violentos, suspense e reviravoltas numa história com grande potencial para o cinema. Tanto que leio, nesta data, no IMDb, que o renomado diretor Martin Scorsese já está preparando a pré-produção do filme homônimo (com adaptação de David Grann e outro roteirista) e nos papeis principais deverão estar conhecidos atores como Robert de Niro e Leonardo DiCaprio. Tem muito petróleo e dinheiro na história, o que motiva os crimes, então vai ser curioso acompanhar também o filme, mesmo conhecendo toda essa história, que se desenrolou há quase cem anos, quando nos EUA ainda imperava em muitas comunidades pequenas um clima de Velho Oeste.
A sinopse do livro postada aqui no Skoob é muito boa, bastante fiel àquilo que Grann escreveu, então, resumindo tudo muito rapidamente, Assassinos... trata de uma grande investigação sobre o assassinato misterioso de membros da tribo osage nos EUA na década de 1920, um caso tão complexo, amplo e chocante que acabou levando à criação do Federal Bureau of Investigation, ou FBI, por J. Edgar Hoover, uma das mais importantes personalidades americanas do século XX. Esses fatos são quase desconhecidos fora dos EUA mas mesmo lá andavam um tanto esquecidos e algumas coisas só foram esclarecidas depois da profunda pesquisa de Grann.
Achei toda a história ótima, não conseguia parar de ler, pois o livro parece fazer, de tanta coisa incrível que narra a cada capítulo, que você tem em mãos um daqueles livros policiais que somente grandes escritores conseguem nos oferecer, em que sobram mistérios e corpos e nada (fatos ou pessoas) é exatamente aquilo que aparenta ser de início. De comum com os nossos tempos, é que a corrupção envolvendo o Estado e a sociedade nos EUA era bastante forte então e precisou de pessoas dedicadas para ser drasticamente reduzida: eram os tempos dos gangsters e da lei seca. O FBI teve de empenhar enormes esforços para elucidar os assassinatos dos índios osage, prender os culpados, excluir agentes suspeitos de suas fileiras, mudar procedimentos para atingir seus objetivos etc.
Nada era fácil para os homens da lei porque sempre havia algum poderoso envolvido ou um ou mais indivíduos comprados para desviar a atenção, colocar empecilhos nas investigações ou tentar acabar com elas. Ou, pior ainda, matar as pessoas que as levavam a cabo, não apenas os índios, o que aconteceu mais de uma vez. Numa breve comparação, enquanto a corrupção no Brasil cobre praticamente todo o território nacional, está presente em todas as áreas, lá a coisa parece que ocorreu de forma mais restrita, mas é porque Grann focou basicamente os crimes contra a nação osage, nas suas terras ricas em petróleo que os brancos cobiçavam e não mediam esforços para tomá-las, muitas vezes contando a seu favor com leis arbitrárias e agentes públicos corrompidos. Outros indivíduos, tutores dos índios (que então não eram considerados cidadãos plenos pelo governo) agiam como pretensos amigos ou protetores deles; na verdade eram astutos e cruéis criminosos, como vamos descobrindo aos poucos.
Há pontos em que a ação se torna eletrizante, mas Grann nunca deixa nosso interesse cair nem mesmo quando se vê obrigado a avançar ou voltar na história ou interromper uma sequência de fatos para o esclarecimento de algum ponto necessário para o completo entendimento do drama todo. Seu trabalho de pesquisa e reconstituição impressiona tanto quanto os acontecimentos que traz ao nosso conhecimento, alguns estarrecedores, como os crimes praticados em família ou a forma violenta como eram praticados. Eles mostram que a cobiça humana por dinheiro e poder não tem limites, nem mesmo quando está em jogo a vida de seres humanos que acreditam piamente em outros seres próximos, que se revelam completamente desumanos no final, verdadeiros monstros. Um grande livro este de David Grann, que pode ser lido também como uma ótima história policial.
Lido entre 22 e 27/09/2019.