Ivy (De repente, no último livro) 24/08/2020
Resenha do blog "De repente no último livro..."
É até complicado para mim definir se afinal gostei ou não desse livro. Foi uma experiência inusitada, única, mas até agora não tenho uma opinião concreta sobre se ler esse livro valeu ou não a pena.
O começo foi extremamente maçante. Eu não conseguia conectar com a escrita do Oscar Wilde, houve um capítulo que inclusive eu cheguei a pular algumas páginas porque achei que ele divagava demais e a trama só foi ganhando forma e se tornando interessante lá pela metade, quando o Dorian começa a enveredar por um caminho mais obscuro ao mesmo tempo em que se tortura o tempo inteiro enquanto encara seu próprio retrato e as mutações que este vai sofrendo com cada ato ruim do Dorian.
O que eu gostei bastante foi a sociedade apresentada por Wilde, bem descrita pelo autor, mostra uma Londres bem mais cinza, descarada e cheia de segredos do que nos romances de época comuns que geralmente encontramos. A maneira como Wilde descreve seus personagens, os diálogos mantidos são carregados de um tom bem crítico. Aliás, o livro inteiro é uma tremenda crítica à certos valores e aí está seu grande charme. Wilde nos mostra abertamente os efeitos nefastos do culto à imagem, é uma crítica à vaidade e aos padrões de beleza tão idealizados que tornam seus portadores pessoas quase acima do bem ou do mal, elevados à um status de superioridade diante dos demais mortais. Esse status permite que essas pessoas saíssem impunes, como Dorian Gray demonstra quando nem mesmo através de seus atos mais vis ele jamais chegava a ser rejeitado por completo, e sempre encontrava mais onde se deleitar, desfrutando da impunidade ganhada por sua aparência impecável.
Infelizmente li a versão comum do livro, sei que alguns trechos dele foram censurados e creio que se tivesse lido todas as partes sem censura talvez a experiência tivesse sido mais completa, porque embora saibamos da metamorfose de Dorian, tudo acontece rápido, pouco é explicado e acaba tudo ficando mais para a imaginação do leitor. Uma pena porque se o leitor realmente soubesse de todos os caminhos do Dorian, creio que pelo menos eu teria sentido mais o personagem, teria "conhecido" Dorian bem melhor, e não de maneira superficial.
Os personagens são interessantes e eu gostei porque embora tenham se apresentado de início bem inofensivos, todos vão passando por mudanças, se tornando mais ácidos. Dorian Gray por exemplo é um misto de mau caratismo e dor, mas no início ele era só um jovem tímido que se consumiu por sua enorme beleza, ele é um personagem atormentado, que quer descobrir tudo mas ao mesmo se angustia e se deleita com o que faz. Temos seu grande amigo Basil que é um personagem bem morno, que apresenta bem o estilo mais pacato e mais centrado de um artista, focado em seus ideais mais nobres e obediente das normas. Por essa figura mais pacata, Basil é julgado erroneamente tanto por Dorian quanto por Henry, este último aliás se tornou um personagem que passei a considerar como o grande vilão da estória. Henry que estimula Dorian a desafiar os limites e as convenções sociais. Henry é aquela figura que muito fala, e no seu falar exerce influência, mas ele mesmo não faz tudo o que fala, embora se divirta vendo os outros cederem e se deixarem guiar por suas idéias. Henry é irônico e em certo ponto um pouco sádico também, e eu achei ele um personagem bem intrigante, ainda que de caráter bem repugnante.
Temos outros vários secundários que aparecem pouco, apenas para dar 'testemunho' da decadência moral de Dorian Gray.
Honestamente, embora os personagems mais importantes fossem diferentes do que costumo ler, não consegui sentir apego ou conexão com ninguém. Ler O Retrato de Dorian Gray acabou por ser uma experiência inédita pra mim, mas ao mesmo tempo não tão envolvente quanto gostaria.
site: www.derepentenoultimolivro.com