Laura Brand 22/07/2019
Nostalgia Cinza
Depois do sucesso estrondoso de 50 Tons de Cinza, E.L. James retorna ao mercado editorial com mais um romance picante que promete ser arrebatador: Mister. O livro já está dividindo opiniões e promete causar mais polêmicas dignas de E.L. James.
Quando se tem em mãos um livro de uma autora que vendeu mais de 150 milhões de exemplares no mundo todo, é inegável criar uma certa expectativa, ainda mais tendo sido lançado após um hiato de alguns anos. Espera-se que a autora tenha desenvolvido sua escrita, aprendido com a experiência e lapidado características que a tornaram famosa. Confesso que estava muito ansiosa para conferir a leitura de Mister porque, quando li 50 Tons de Cinza, tive alguns problemas com os livros, principalmente no que diz respeito à personalidade dos protagonistas e à escrita da autora.
Mister promete ser um conto de fadas moderno, com características de Cinderella ao apresentar uma protagonista inexperiente e sem recursos, que se apaixona por um homem da realeza que promete ser seu salvador, praticamente um príncipe encantado e perfeito. O mocinho, por sua vez, se apresenta como um homem perturbado que precisa de uma mulher para consolá-lo e torná-lo alguém melhor.
Foi interessante notar como a autora tinha uma clara preocupação em não deixar o enredo tão superficial, buscando pegar assuntos mais densos para servir de pano de fundo da história. Ela fala sobre o tráfico de pessoas e, a princípio, pensei que ela poderia aprofundar um pouco mais para dar mais densidade à narrativa, mas infelizmente, E.L. James mantém o romance como o principal, deixando de lado grande partes das características que poderiam dar um toque de realidade ao livro.
Acredito que a autora tenha perdido uma ótima oportunidade de explorar o choque cultural dos personagens e até mesmo trabalhar melhor os cenários onde se passam diversas cenas do livro.
Mister não inova no enredo, na construção de personagens, no desenvolvimento da história, nas reviravoltas. E.L. James se baseia em todos os clichês de romances: mulher virgem e inocente, homem garanhão em busca de redenção, vilões atrás da mocinha e o mocinho com a missão de salvá-la.
Diversas vezes senti que, logo quando o livro me surpreendia e parecia ficar mais promissor e, principalmente, inteligente, as expectativas eram derrubadas e precisei levar em conta que provavelmente seria apenas mais um romance com muitas cenas de sexo e reviravoltas pouco críveis de acordo com o contexto.
A autora também peca no exagero nas cenas de sexo o que, mesmo sendo parte do propósito do livro, acaba tornando a leitura mais do mesmo até que algo aconteça na narrativa. Esperava-se que essas cenas fossem bem presentes porque, afinal, fazem parte do gênero e da premissa do livro, ainda mais levando o nome de E.L. James na capa. Entretanto, principalmente no meio do livro, todas as cenas tornam-se absolutamente excessivas e repetitivas. Acredito que existem livros do gênero que são voltados quase que totalmente para o envolvimento sexual dos protagonistas, mas que não pecam pelo excesso, buscando acrescentar algo novo a cada cena, o que não acontece em Mister.
Algo que me incomodou nas partes narradas por ele é o nível de autocrítica que a autora atribui ao protagonista. Os pensamentos não condizem com as ações e não faz sentido ele ter ciência de alguns detalhes e fazer reflexões que um narrador onisciente faria. Não entendi a escolha da autora se, quando o foco está em Alissia, a narração é em terceira pessoa. A narrativa ganharia um peso muito melhor se tivesse um padrão. Não faz sentido alternar entre primeira e terceira pessoa dessa forma, ainda mais levando em consideração que nenhum dos pontos de vista foi explorado em profundidade. Fiquei com a impressão de que ali havia uma tentativa de minimizar as críticas ao protagonista (que foram bem duras com o galã de 50 Tons de Cinza) ao colocá-lo como autocrítico e ciente de seus próprios demônios.
Além disso, me incomodou bastante a forma como ao mesmo tempo em que ela faz os personagens darem uma importância desproporcional para detalhes que seriam, em outras narrativas, insignificante, eles agem com naturalidade em momentos em que essa atitude não caberia. Em meio a um dos momentos mais dramáticos do livro, por exemplo, o protagonista se diverte turistando e tirando fotos de paisagens.
Mister termina com muitas pontas soltas, o que dá a entender que terá uma ou mais continuações. Continuo com vontade de conferir o que E.L. James reserva para os próximos títulos, na esperança que ela possa se preocupar mais com o desenvolvimento dos personagens, trabalhe mais no enredo e na condução da narrativa. Como fã de romances, não canso de dar uma chance para uma história de amor, só espero que possamos encontrar narrativas mais envolventes e bem-escritas nos próximos trabalhos de E.L. James.
A escrita de E.L. James melhora razoavelmente se compararmos Mister com os livros de 50 Tons, que lhe deram fama. Apesar de ainda ter muitos diálogos, a narrativa conta com mais descrições e uma tentativa maior de criar um enredo com princípio, meio e fim. Também percebe-se uma preocupação maior em relação às atitudes dos personagens, principalmente do protagonista masculino. Ao contrário de 50 Tons, em Mister a autora se esforça para justificar pensamentos e atitudes do personagem, tentando criar uma identificação para com o leitor. É possível observar uma evolução nesse sentido, entretanto, não funciona sempre.
É um livro bem rápido de ler, muito semelhante a diversos outros títulos com o mesmo propósito, então muitos fãs de romances encontrarão conforto na história de E.L. James, mesmo não sendo o melhor exemplo de livro do gênero.
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