@aprendilendo_ 02/05/2021
Resenha de Ensaio sobre a Cegueira
Escrita por José Saramago e publicada pela primeira vez em 1995, Ensaio sobre a Cegueira, a obra-prima de seu autor português, o qual venceu o Prêmio Nobel da Literatura, tem como trama a pandemia de uma doença chamada “mal branco”. Nesse contexto, a enfermidade, com uma capacidade de contágio e características nunca vistas antes, torna a pessoa contaminada cega por uma luz leite-pastosa. Como consequência, rapidamente, o mundo entra em um completo caos, fazendo com que o governo tome medidas drásticas e céleres, como levar os primeiros pacientes para um manicômio a fim de impedir a disseminação da lástima. A partir disso, acompanhamos uma triste e traumatizante história sobre a profundidade de uma sociedade em decadência.
De início, com um estilo de escrita excêntrico, caracterizado por parágrafos prolongados e diálogos separados apenas por vírgulas, a narrativa começa com um bom tom de mistério e urgência. Nesse sentido, Saramago consegue desenvolver bem a sensação de desespero e confusão, a qual é causada pela repentina pandemia. Tal elemento, ainda, é ressaltado quando, no decorrer dos momentos no manicômio, há toda uma construção claustrofóbica do ambiente, a qual, a cada palavra, torna a história mais densa e sufocante, fazendo com que os acontecimentos realmente pesem na narrativa. Sobre tais momentos, temos aqui uma visceral demonstração de extremos. O escritor, sem pensar duas vezes, toma o caminho mais impactante possível, em uma clara busca pelo estudo do ser-humano em situações animalescas. Como consequência, o desconforto persegue o leitor da primeira à última página.
Sobre os personagens, apesar de não haver uma contextualização, no sentido de explicar o passado de cada um, ou sequer seus nomes, a obra sai-se muito bem em criar uma boa imersão entre o leitor e cada indivíduo, responsável por gerar empatia entre ambos. Nesse contexto, o real foco narrativo é encontrado na “Mulher do Médico”, única pessoa não contaminada pela doença e responsável por engrenar os pontos mais importantes da história. Por meio dessa personagem com a visão inalterada, o escritor, de maneira inteligente, faz um bom jogo para que, gradualmente, sintamo-nos em seu lugar e presenciemos a total desordem do mundo cego na pele. Por claro, isso apenas reforça a dolorosa experiência de acompanhar os acontecimentos da trama e novamente, a característica de desconforto literário surge como elemento inerente do livro de Saramago.
Ensaio sobre a Cegueira é impactante, visceral e desconfortável, mas, igualmente, capaz de gerar inúmeras reflexões sobre o ideal da dignidade humana, o “ser” e a sociedade. Por claro, não é uma leitura agradável no sentido estrito da palavra, mas nunca, podendo ser caracterizada como ruim, apenas um livro desafiador e envolvente, o qual causa sentimentos diversos no decorrer de suas páginas.
Nota: 9.0
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