jota 18/11/2014Meu mundo caiu...O Mundo se Despedaça (Things Fall Apart), do nigeriano Chinua Achebe (1930-2013), sempre é citado nas listas de obras em língua inglesa como um dos melhores livros do século XX. Com razão.
Do modo como Achebe nos conta, com sua escrita clara, irrepreensível, é impossível não ficar envolvido com a história do guerreiro Okonkwo (casado com três mulheres e pai de onze filhos), membro da etnia ibo, e de sua aldeia situada às margens do rio Níger, no sudeste da Nigéria.
É ficção, claro, mas está (ou estava, já que o livro foi publicado em 1958) tão profundamente entranhada de realismo que parece que você está lendo um livro de Etnografia, sem a desvantagem de certo academicismo que uma obra desse ramo de conhecimento pode ou deve conter. Mesmo assim cada capítulo vem recheado com inúmeras notas explicativas de rodapé. E também há uma útil Introdução de um especialista brasileiro em cultura e povos africanos, Alberto da Costa e Silva.
Como se sabe, o título original – Things Fall Apart - foi retirado do trecho de um poema de W. B. Yeats, The Second Coming, de 1920, que tratava do fim de uma era da sociedade ocidental, marcado pela Primeira Guerra Mundial. Da mesma forma, o livro de Achebe mostra a decadência da cultura ibo (e por analogia de outras etnias e grupos africanos) com a chegada do colonizador branco no continente, especialmente missionários ingleses.
Os fatos narrados por Achebe se passam durante o período colonial da Nigéria, mais para o final do século XIX, quando reinava a rainha Vitória (de 1837 a 1901). O país somente se tornou independente em 1960. Mas antes que isso acontecesse, antes que a desintegração do mundo ibo começasse, por um número expressivo de páginas seguimos Okonkwo e sua gente praticando suas crenças, rituais, magias etc., talvez a parte mais curiosa da narrativa.
Por exemplo, entre os ibo gerar gêmeos era uma aberração da natureza e então esses recém-nascidos eram abandonados numa floresta para que morressem. Ao mesmo tempo nos familiarizamos com diversos outros aspectos da cultura do grupo, quer dizer, com seus modos de pensar, sentir e agir cotidianos, muitos deles girando em torno da cultura do inhame, principal alimento consumido pela aldeia.
Por tudo isso e muito mais, o Times escreveu que O Mundo se Despedaça é “Um romance que enxerga a vida tribal de um ponto de vista interno, genuíno.” Daí que para um leitor comum, mas ligado no mundo e em suas transformações, naturalmente o livro de Chinua Achebe é muito mais saboroso de se ler do que alguma obra etnográfica sobre determinado agrupamento humano considerado primitivo.
Lido entre 15 e 18/11/2014.