Fabricio~Raito 12/12/2014
Morte Súbita: teste de paciência
Morte Súbita (Casual Vacancy, no original) é o primeiro livro de J. K. Rowling após a conclusão da saga Harry Potter. Nele, ela buscou atingir o público mais adulto, traçando uma história inteligente porém que logo se pode se mostrar desanimadora.
Pagford é uma pequena cidade do interior, com aparência idílica de um vilarejo e que esconde uma guerra: ricos versus pobres, adolescentes versus pais, esposas versus maridos, professores versus alunos e sistema versus sistema. Após a morte de Barry Fairbrother, Conselheiro de Pagford, os remanescentes logo começam a desejar e elaborar planos para ocupar a vaga que o falecido deixou no Concelho. Enxergam na emancipação desta vaga mais do que a sua simples ocupação, mas uma possibilidade de fazer valer suas ganâncias e vencer uma disputa entre ideologias dos próprios membros do Concelho. Assim, as famílias de Pagford são apresentadas, com seus inúmeros e bem construídos personagens, a partir de diversos núcleos, trazendo visões e dilemas recorrentes e interessantes, narrando os anseios, artimanhas e problemas do cotidiano. Tudo sob a excelente e indiscutível escrita de J. K. Rowling.
Então, contando com tantos pontos positivos, por que Morte Súbita foi tão duramente criticado? A inteligente escrita de J. K. Rowling não foi o suficiente para criar em mim uma vontade maior de continuar a leitura, quando pressentia a chegada do sono ou desejo de realizar outra tarefa. Nem mesmo a excelência da criação, descrição e desenvolvimento de seus vários (e críveis) personagens. O livro simplesmente não cria um mistério ou enigma ou suspense que me mobilize a desejar chegar ao seu desfecho e, assim, acreditar encontrar respostas. Ele simplesmente descreve o cotidiano dos moradores de Pagford, com todas as suas monotonias e frivolidades, o que se revela bastante desencorajador e desanimador. Afinal de contas, são quinhentas páginas de muita descrição e vivências (em partes, desinteressantes e desnecessárias) para um grande número de personagens.
Porém, não me dei por vencido pelo marasmo que enfrentei em diversas passagens do livro, e segui adiante. Creio que seja importante apontar que todos os acontecimentos cotidianos em Pagford (cansativos, desinteressantes, interessantes, chocantes ou não) foram intencionais e compõem a obra quando vistos do ponto de vista que é disto que Morte Súbita se trata. É de retratar uma pequena cidade e seus dilemas, da trajetória da cidade, de politicagem. É de criticar, de forma dura e explícita, as falhas humanas em suas relações interpessoais e como cidadãos em uma sociedade. E se, mesmo com todo o brilhantismo da autora, o desenvolvimento se mostrou mais morno do que quente, eu jamais estaria preparado para os últimos acontecimentos, descritos nos capítulos finais. Após fechar Morte Súbita, sentei na cama e fiquei olhando por vários segundos para o nada, com um nó na garganta, sendo arrebatado por milhares de questionamentos que as críticas apresentadas geraram em mim.
Morte Súbita é um livro interessante e corajoso. Mas peca ao exigir coragem (e paciência) também de seus leitores, uma vez que a leitura não é fluida e dinâmica. É válido por trazer questionamentos e críticas sociais, além de apresentar personagens extremamente bem elaborados, entre os quais existem os que você se apega e aqueles que você odeia a ponto de se enfurecer na vida real. Vale todo o tempo dispendido em sua leitura.