Maris 02/01/2010
Nota-se pelo apêndice desta edição que C. S. Lewis foi um homem inteligente, e com uma mentalidade ideal para que fosse um ótimo escritor. Mas, por algum motivo estranho, esse potencial pode ser reconhecido apenas em algumas partes do livro, especialmente na última crônica. De resto, as histórias são exageradamente oníricas - o que deixa a sensação de que o autor as escreveu em estados alterados de consciência, o que, por sua vez, sendo verdade ou não, deixa a sensação de que o autor não tem muita criatividade (é como se precisasse sonhar, ou se drogar, para ter idéias) -, exageradamente moralistas, exageradamente maniqueístas, exageradamente anti-árabes e exageradamente cristãs (chega a ser ridículo quando se sabe que a religiosidade de Lewis era indefinida, ao contrário da de Tolkien, que, mesmo sendo cristão fervoroso, não deixou que isso sujasse tanto seus livros).
Meus filhos, quando eu os tiver, não lerão As Crônicas de Nárnia, ao menos não até que estejam maduros o suficiente para saber que não é preciso ser branco para ser bonito, nem ser bonito para ser bondoso. Maduros o suficiente para saber que não há bem ou mal, e muito menos que o mal deve necessariamente ser representado por criaturas feias e/ou burras ou por humanos de características fisionômicas e culturais árabes. Isto é tolice do tempo das cruzadas! Sem falar na pregação religiosa insuportavelmente tosca representada pela figura do leão Aslam, "alter-ego" do Deus bíblico em Nárnia. É uma associação muito forçada a feita entre o tal leão e "todas as coisas boas", é como propaganda de cigarro mostrando pessoas legais fazendo coisas legais: "cigarro tem a ver com tudo que é legal, se você gosta de coisas legais e de ser legal, fume". O mesmo acontece aqui, o autor usa de todos os seus poderes criadores para afirmar e demonstrar que tudo o que é bom e belo tem a ver com Aslam, se você gosta das coisas boas e belas, então goste de Aslam, siga Aslam, ame Aslam (e, claro, querida criança manipulável, não esqueça que Aslam é Deus). Uma lógica duvidosa, mas que é a base de muitas religiões, as quais não quero que meus filhos sigam, e, caso eu não consiga os impedir, pelo menos não quero que sigam com base nesse tipo de argumento pega-trouxa (e qual argumento religioso não é pega-trouxa?).